Ti Zefa era a mulher que na aldeia “ aparava” os bébés que nasciam.
Como não havia hospital ou maternidade por perto, fosse rica ou pobre, todas as mulheres recorriam às mãos hábeis e curiosas da Ti Zefa.
Claro que não havendo sequer os cuidados mínimos de higiene todos , ou quase todos, nasciam sem mazelas, pelo menos visíveis.
Fosse a que horas fosse, estivesse na cama ou no trabalho do campo, havia sempre um marido aflito a gritar por ela:
__ Venhadepressa que a mulher já está com as dores Não se demore !
E lá ia ela ligeirinha a “ atender” a parturiente.
Lavava as mãos à pressa e com a mesma pressa chegava.
E tudo começava
O marido ficava à porta, do lado de fora. Podia ser preciso alguma coisa.
Ele tinha parte passiva na questão.” Aquilo” era coisa de mulheres. Ficava perto do quarto sentado a ouvir e quando o primeiro choro do bébé soava, alegrava-se e suspirava de alívio. Pronto ! Já está !
A Ti Zefa, acabado o serviço, era agora a sua vez de uma “ pinguinha” para acalmar. E se ela gostava ......
Sentava-se numa cadeira junto à cama da comadre e ficava a olhar embevecida, o bébé que dormia
É que todas as mães da aldeia lhe transmitiam o estatuto de Comadre por lhes ter “ aparado “ os filhos Isto é lhes ter feito o parto. Era a única entendida por aqueles lados. Tinha muitas comadres, por isso.
Para companhia de boas petiscadas era a comadre Marquinhas.
Cozinheira de profissão. Companheira e comadre de bebida. Tambem ela gostava, e muito ........
Cara redonda, vermelha, com algumas borbulhas. Sinais evidentes de quem bebia bem.
Um antigo governante português dizia que “ beber um copo de vinho era dar de comer a um milhão de portugueses “
Não deixavam créditos por mãos alheias. Bebiam bem até fartar !
A Senhora Marquinhas era chamada para os casamentos e batizados. Uns dias antes da boda ia a casa dos pais da noiva ou do noivo, conforme o caso e “ atacava” logo com um copo de tinto. Depois de ajudar a matar o porco ou os carneiros iam mais uns quantos para aquecer.
As receitas dos cozinhados do casamento já se faziam por intuição A comida chegava sempre.
Os convidados na sua maioria, gente do campo, tinham uma refeição melhorada. Era dia de festa e os pais dos noivos não olhavam a despesas Era em tudo um dia especial Havia que disponibilizar o melhor tanto para a boda como para a cozinheira. Mais filhos para casar e esta cozinheira a saber os “ preceitos” todos. Vinho com fartura e a Comadre Marquinhas já ficava contente.
Quando as duas se juntavam era uma festa.
Domingo à tarde na aldeia. Ninguem por perto e lá iam as duas até à taberna do Ti Xico Sapateiro. Conversavam e conversavam as desgraças da vida. Ambas viúvas de muitos anos. Uma porque o filho não dava notícias há muitos anos A outra porque a filha se casou para longe e raramente vinha ver a mãe. O genro tambem não era “ grande coisa “
As duas desfiavam um rosário de tristezas que se iam avolumando conforme o vinho ia diminuindo dentro da garrafa. O taberneiro ia enchendo de tinto .... E elas iam bebendo .......
E conversavam ..... e bebiam ........ e mais um copo ...... mais uma gargalhada ......
As faces já vermelhas mostravam bem o resultado de uma tarde de conversa e bebida .
Já noite fechada, Ti Zefa olha para a rua por entre a porta entreaberta. Vê que já é noite fechada . Olha para a garrafa vazia , vira-se para a comadre e comenta:
__” Oh Comadre ! Como nós estemos. Já chama fagarra a uma ganfarra “!!!!!!!
Natércia Martins