tag:blogger.com,1999:blog-74439231175460806612024-03-13T18:23:04.715+00:00Andar por cáNatércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.comBlogger94125tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-11016691546922384912020-02-23T21:35:00.003+00:002020-02-23T21:37:01.662+00:00Sopa, sopas e papas<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Segundo a opinião dos
gastrónomos a sopa é uma mistura pastosa de água e alguns ingredientes tão
variados quanto a nossa imaginação.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Alimento milenar que, segundo
algumas opiniões apareceu pouco depois de ter sido descoberto o fogo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O curioso da questão é que
quando ainda não havia utensílios de barro ou metal, coziam uma espécie de sopa
em buracos existentes nas pedras entretanto aquecidas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Há sopas feitas somente com
pão e água, outras com cereais e ainda outras com hortaliça que são as mais
comuns.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Há, ainda, outras opiniões que
colocam a sopa como alimento da pré-história, portanto muito antes do
aparecimento do fogo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A sopa tem como base a
cozedura em água de hortícolas, leguminosas ou tubérculos aos quais se associa
azeite e sal.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A sopa é o alimento ideal para
o bom funcionamento do organismo principalmente os intestinos, devido à
presença de fibras, água e também pela temperatura a que é servida.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Se comermos um prato de sopa o
apetite fica mais reduzido para o prato que se segue. Em suma: a sopa prepara o
estômago para o prato seguinte.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Costuma-se dizer, a grosso
modo, que a sopa é a tranca da barriga. E é por isto que a sopa deve ser comida
no início da refeição devido à sua condição de saciante.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A maior parte das sopas são
feitas com ingredientes cozidos, portanto, quentes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A sopa de pedra onde entra a
história do frade comilão, mas engenhoso que foi pedindo os ingredientes para
uma sopinha já tendo uma fogueirita e uma panela a ferver com uma pedra lá
dentro. Foi-lhe sendo facultado tudo o que pedia e havia na casa onde se
abeirou e comodamente se sentou num degrau: as couves, o pedaço de chouriça os
feijões, a cenoura, o sal e o azeite. Os
donos da casa queriam ver o que saía dali, tal era a curiosidade. Era apenas
uma saborosa sopa. O frade comeu e saboreou. A pedra? Bem, a pedra ficaria para
a próxima sopa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Parafraseando o inteligente
frade, dizia-se na minha aldeia que: havendo água até com uma pedra se faz
sopa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ainda, voltando uns anos
atrás, na história humana, o homem caçador por natureza e também por
necessidade, se deu conta que havia carnes duras e ficavam macias e saborosas
quando cozinhadas em água e ervas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Conta-se que na idade média a
sopa consistia num pedaço de pão sobre o qual se vertia um caldo de carne,
legumes ou vinho a ferver, diretamente para a travessas fundas de barro ou
estanho.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A partir do séc. XVI a cozinha
foi ficando mais sofisticada e começou a introduzir-se massa, tomilho ou
frango.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As sopas podem ser feitas de
qualquer coisa, sendo alimento acessível a todas as bolsas, possui a vantagem
de reter no seu caldo os nutrientes dos respetivos ingredientes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Para famílias de fracos
recursos a sopa era, em tempos, o único prato da refeição.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Há sopas frias como o gaspacho
ou as célebres sopas de cavalo cansado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No interior do país ainda se
usa fazer sopas de café para o pequeno almoço. Consiste em colocar pão velho no
fundo da tigela, açúcar e finalmente o café.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As sopas de cavalo cansado
como pequeno almoço era considerado um tonificante para pessoas com pouco
físico. As crianças também comiam e gostavam. Era a forma que os pais
encontravam de obter melhor rendimento no trabalho. Seria?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O que são as sopas de cavalo
cansado? Tão simples como colocar, numa tigela, pedaços de pão velho embebido em
vinho tinto, açúcar, canela e para ficarem mais nutritivas um ovo crú.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As papas laberças nasceram a
partir das sobras da sopa de nabos. Com o resto da sopa que sobrou coloca – se
água, sal e azeite. A farinha de milho deve deitar-se em chuva para não ter <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
grumos desagradáveis. Fica uma
papa mole que se come com sardinha assada por cima ou toucinho frito ou ainda
com bacalhau assado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Papas de carolo, muito
utilizadas no interior do país. São feitas com água, um fio de azeite e farinha
de milho, numa “ moedura” que os moleiros na época não gostavam de fazer.
Tinham que subir a pedra da mó. Comiam-se com mel por cima ou açúcar amarelo.
Penso que terá caído em desuso. Hoje faz-se uma papa semelhante com leite e
polvilhadas com canela.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Papas de sarrabulho. São
oriundas do Minho e confecionadas com o sangue do porco, carne de galinha,
salpicão e presunto. O pão velho é mais uma vez o ingrediente principal assim
como a farinha de milho e especiarias.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Papas de abóbora. Muito
apreciadas, as papas de abóbora, são feitas com abóbora cozida e triturada,
azeite, farinha e condimentos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Finalmente as papas de entrudo
que se comiam na Beira Baixa. Feitas de pão velho, ensopadas em água de cozer
as carnes do cozido, limão,ovos e hortelã.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As confrarias, e há muitas,
são associações que têm por objetivo a investigação e divulgação do património,
tradições e receitas das regiões. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As confrarias tentam manter o
legado histórico valorizando o território e têm a finalidade de não deixar
desaparecer os usos e costumes do povo português.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="font-family: "calibri" , sans-serif; font-size: 11.0pt; line-height: 107%;">Natércia Martins</span>Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-61535904105900260842020-01-29T17:12:00.001+00:002020-01-29T17:12:46.666+00:00Domingo à tarde<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Domingo de um agosto com sol
descoberto há algumas horas já.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Sentei – me na cadeira de
praia que tenho na varanda.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Àquela hora, manhã cedo e já
os barulhos característicos da mata se faziam ouvir ali tão perto.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Gosto particularmente do canto
das cegarregas, que só se calam no inverno. Elas conversam umas com as outras e
talvez com quem mora ali perto. Há quem as sabe entender. Gosto. Pronto!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Olhei, mais uma vez o relógio,
cujos ponteiros teimam em não se mover. Lentos, lentinhos para o meu gosto.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Avizinhava-se uma tarde de
domingo chata, sem nada que fazer. Pelo menos não me apetecia fazer nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ler um livro? Não! Escrever?
Também não! Bem puxava a “ponta do fio” que teimava em não aparecer. Quando o
fio aparece as palavras saem em catadupa. Não era o caso. Nada!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Peguei na chávena vazia do
café que bebi e que me soube tão bem. Ao menos isso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Já que ideias não havia nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A chávena deu uma série de
voltas na minha mão. Vá lá não caiu! Mas ideias …… Nada!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Do fundo da rua alguém chamou.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Bolas! Num domingo de
manhã, com tanto calor e já me chamam.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não me apetecia ler, não me
apetecia escrever e não me apetecia falar. Os ponteiros do relógio continuavam
a não querer andar. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tornaram a chamar. Respondi
quase só para saberem que estava ali já acordada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Do fundo da rua perguntaram:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Quer vir? Vamos fazer uma
caldeirada à beira rio.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Respondo e vi que algumas
pessoas me esperavam ao fundo da escada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Levavam uma panela, uma trempe
para a fogueira, e a parafernália de instrumentos de cozinha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Também levavam cebolas,
batatas, pimentos, alhos. Enfim! Tudo o que era preciso para a dita caldeirada.
<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A fome ia connosco. Vi que
levavam uma bola e muita conversa. Isso era bom. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Chegados à beira rio,
apanharam uns gravetos que por ali havia e fizeram uma fogueira acautelada por
pedras, não fosse o fogo “fugir”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A Senhora Adelina tomou conta
da situação. Vagarosa, sem pressas colocou a panela no fogo, cebola às
rodelinhas, as batatas, o tomate, a salsa, o pimento, etc etc. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O peixe entrou cuidadosamente.
Primeiro o mais firme. Depois o mais delicado<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A panela fervia num fogo
lento. Ali não havia pressas. Afinal tínhamos a tarde de domingo por nossa
conta. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O cheiro da panela aumentava a
nossa vontade de almoçar também. E a caldeirada não havia jeitos de sair. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A cozinheira abriu a panela.
Que rico cheirinho.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>A panela fervia
agora mais lento ainda. A apurar!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Jogámos à bola, à corda, ao
pião e finalmente a bendita caldeirada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Estava boa. Muito boa! Eu que
gosto pouco de tal prato. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Já noite fechada votámos para
casa. Passei uma tarde de domingo sem me lembrar que, quando saí da cama não me
apetecia fazer nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Belíssima aquela tarde.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando voltamos?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
Natércia Martins<o:p></o:p></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-23137486667134566512020-01-01T17:11:00.002+00:002020-01-01T17:11:33.497+00:00Estrelas e planetas<br />
<br />
<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 14.0pt;">Estrelas e Planetas<o:p></o:p></span></b></div>
<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Fez um percurso normal na escola, denotando já preocupação e vontade de
estudar a Natureza. José foi um bom aluno, apesar de não ser estudante muito
acima da média. Já, nesse tempo se preocupava com a observação das plantas e
animais. Era alegre e parecia estar sempre a gozar com o professor.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Respostas rápidas e sempre a tempo.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Ainda em criança e depois adolescente gostava de fazer campismo e junto
com os pais e irmãos correu muito do país. Assim, em contacto com a Natureza,
viu que o ar é mais leve e a noite mais atractiva que a ruas iluminadas da
cidade.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Sentava-se junto da tenda e ouvia o silêncio do parque. Tudo sossegado
e as estrelas lá em cima como pontinhos brilhantes que bordavam o céu.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Na verdade, cada pontinho brilhante faz parte de um grupo com formas
geométricas. Descobriu a Ursa Maior, Ursa Menor, Cassiopeia e Orion e muitas
mais constelações.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Mais tarde, com dinheiro que foi amealhando, comprou uns binóculos.
Passou a observar a lua, redondinha, cheia, cravada no céu. A lua sorria-lhe e
ele sorria para ela.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Convidou o amigo Luis para passar um fim-de-semana no campismo. Este só
conhecia a noite na sua rua. Perto de casa. Admirou-se, porque as paredes da
tenda eram de pano e a cama no chão. Mesmo assim, gostou de observar o céu como
nunca o vira. Era lindo!<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">E o gosto foi-se avolumando. <o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">José ouviu a notícia que, numa noite de lua nova, ia acontecer uma
grandiosa chuva de estrelas. Mais uma vez pesquisou no computador. A chuva de
estrelas não é mais que meteoritos que ao entrar na atmosfera se desintegram em
pequenos fragmentos incandescentes, dando a ilusão de estrelas a mudar de sítio.
Muita gente ainda pensa que são estrelas cadentes e é costume pedir um desejo,
enquanto deixa atras de si um rasto de fogo. E ele também pediu um desejo,
muitos desejos, perdidos na sua cabecita de adolescente.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Tantos desejos como estrelas cadentes que viu naquela noite. E foram
muitas.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">O tempo foi passando e o gosto pela observação agudizou-se. Pesquisou e
comprou revistas. <o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Como todos sabemos a aldeia é cheia de lendas em que bruxas e
lobisomens são os principais actores.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">O meu vizinho, sentado sentado na soleira da minha porta, numa noite
quente de Agosto contava histórias. É um bom contador de histórias. <o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Contou, numa dessas noites, que no cruzamento ao fundo da ladeira as
bruxas se juntavam em grandes farras em noites de lua cheia. E contava, também,
que o patrão delas, cornudo e pés de cabra as acompanhava nas danças à volta de
uma grande fogueira. <o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Dizia conhecer um homem da aldeia, que sentado à lareira, via passar
todas as noites, à sua frente, uma galinha pedrêz. Uma noite, já farto,
arrumou-lhe com a tenaz do lume. A galinha desapareceu, mas a mãe dele, de manhã,
estava de cama com uma perna partida. Concluiu que a galinha que lhe passava em
frente todas as noites era a mãe transformada em bruxa e também dançava todas
as noites, ao fundo da ladeira, com o tal cornudo com pés de cabra.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Com estas e outras histórias semelhantes se faziam os serões, no verão,
à porta da rua.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Numa noite escura de breu, o José convidou o vizinho Luis para mais uma
observação observação lá em cima, no barreiro, perto do pinhal. Dizem que andam
por lá almas penadas (estas andam por todo o lado), bruxas e labisomens.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Montaram o tripé, os binóculos e um pequeno telescópio. O canto dos
grilos e o piar de um mocho, cortou o escuro. De resto, o silêncio.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Sem se fazer ouvir um outro vizinho cuscuvilheiro, foi, de mansinho,
ver por onde andavam os rapazes. Aproximou-se. O luis, brincalhão, escondeu-se.
<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">O homem quis ver pelos binóculos. Sentiu uma ponta do casaco a ser
puxada devagarinho. Soltou um suspiro. Arrepiou-se. Era verdade! Duvidou. Outro
puxão no casaco. As bruxas! <o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;">Desatou a correr e só parou quando os rapazes desataram a rir às
gargalhadas.<o:p></o:p></b></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-88705357241878755962019-12-22T16:01:00.001+00:002019-12-22T16:02:22.685+00:00Menino Jesus<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Em casa da minha avó não se
fazia presépio. A árvore de natal, muito menos. Nem se sabia que era possível
levar um pinheiro para casa e enfeitar. Os enfeites viriam a ser
comercializados muitos anos depois da minha meninice. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Havia, sim, um presépio na igreja
que admirava sempre que lá íamos. O menino Jesus era levado pelas mãos do Padre
António, com carinho embrulhado em rendas, e todos os fiéis, na missa do galo,
iam beijá-lo. Cerimónia simples, mas que, eu, pequena, via com enlevo.
Cerimónia repetida todos os anos, mas que para mim era sempre a primeira vez.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os rapazes transportavam um
enorme madeiro que ardia no adro todo o tempo das festas natalícias. As
mulheres iam lá com uma pá e levavam as brasas acesas para os ferros de
engomar. Lá em casa iam buscar, também, para pôr na braseira que à noite nos
aquecia os pés.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Aquele enorme braseiro no adro
da igreja sempre me fez alguma confusão. Até julgava que seria para assar o
galo já que se tratava da missa do galo. E quem dava o galo? <span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha tia Laura, ainda
solteira morava com a mãe, minha avó, é que me explicou que a fogueira tinha a
finalidade de aquecer os pobres desprotegidos que ali passavam já que a noite
era muito fria.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas a figura do Menino Jesus
inquietava-me. Então aquele menino só vestia um paninho de renda e não tinha
frio? É que a figurinha de barro aos meus olhos de criança era um menino de
carne osso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tinham-me dito que o Menino
Jesus trazia as prendas. Então eu e o meu irmão mais pequeno, íamos colocar o
sapato na chaminé do fogão já apagado. No outro dia de manhã lá estavam os
presentes que se resumiam a uma caneca de barro, uma mala para a escola ou um
casaco. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ora se as prendas eram
trazidas pelo menino Jesus que descia pela chaminé eu tinha de o encontrar. E
se o visse? O que lhe iria pedir? Onde trazia as prendas? Eu podia escolher?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Perguntas que todos os anos
ficavam sem resposta pois ele mais lesto, ia lá pôr tudo às escondidas. Deixava
que todos adormecessem lá em casa e eu, para o encontrar ia pé ante pé, no
corredor, para falar com ele. Pois sim! Quando lá chegava já ele tinha passado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Cheguei a pensar que era
maroto e não gostava de mim. Mas se me dava prendas ….. então não lhe era
indiferente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Passaram-se alguns anos e,
claro, cresci, obedecendo às leis da natureza. O meu maior desgosto foi quando
soube que afinal o Menino Jesus das prendas no sapatinho era a minha tia que lá
ia pôr. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Passou muito tempo. Agora
fazemos, em minha casa o presépio e a árvore de Natal, enfeitada com festão de
cores. Até há um Pai Natal a subir nas escadas. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Menino Jesus é o que me
prende sempre a atenção. Este, que tenho, é lindo. Deram-mo. Tenho-o no meu
quarto juntamente com S. José e Maria. Quando, nas noites sem sono, me levanto
e olho, imagino - o no presépio na minha terra rodeado de palhinhas. Converso
com ele. Conto-lhe porque estou mais triste. Ele sorri. Depois quando me deito
e durmo, sonho com a minha avó sentada na mesa redonda com a braseira a aquecer
os pés, a minha tia Laura belíssima contadora de histórias que nos fazia “ver”
tudo o que contava.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Eram assim os natais na minha
terra onde não havia luz elétrica nem água a jorrar das torneiras. O tempo
corre, sem sermos capazes de o agarrar. Hoje é um lugar igual a tantos outros
que existem por aí. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-56494052198447944942019-12-17T20:50:00.003+00:002019-12-17T20:50:34.639+00:00A menina dança ?<br />
<br />
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Era quase sempre assim que uma
moda se começava a dançar num ritmo calmo com os corpos bem juntinhos e os
rostos quase unidos. As mãos seguravam sonhos e fantasias, muitas vezes só na
cabeça do rapaz ou da rapariga.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os bailes dos anos sessenta ou
mesmo de setenta eram calmos bem ritmados por uma balada e o cadenciado dos
passos no chão da sala.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Fui a muitos desses bailes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Teria os meus quinze anos
quando fomos a um baile de carnaval ao salão do Clube. Teria “bom pé” porque
nunca mais parei. Lembro-me tão bem! O rapaz, cujo nome nunca esqueci, também
dançava muito bem. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Eramos sempre acompanhadas
pelas mães ou irmão. As mães sempre vigilantes não fosse o rapaz atrevido e
roubasse um beijinho ao seu par. Era assim nesse tempo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Havia muitas espécies de
bailes. Eu gostava de todos desde que se dançasse.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Na eira do Ti Chico também se
faziam. O som da concertina mais ou menos afinada com alguma “fífias” pelo meio,
tocava as modas da época. O convívio e a folia reinavam e também havia
namoricos que começavam naqueles bailes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os rapazes das aldeias
vizinhas apresentavam-se para dançar, o que não era bem visto pelos da aldeia e
quantas vezes o baile acabava à paulada. Sim porque o rapaz desse tempo
fazia-se acompanhar de um cajado que deixava no lado de fora do local do baile.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O meu pai chamava – lhes baile
de coça barriga. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Também, na época, se usava o
buffet que na maioria das vezes não era mais que uma mesa e copos onde se
vendia cerveja e vinho.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os rapazes bebiam pouco mas
juntavam-se ali por perto na conversa. Quando a música começava lá iam eles à
procura do par. Muitas vezes o par já era certo e não se dançava com mais
ninguém.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os “pés de chumbo” é que eram
uma chatice. Não sabiam dançar e pisavam os pés da rapariga. Uma vez, que me
lembre, apanhei um desses pés de chumbo e deixei-o no meio do baile. Chorei
muito pois eu gostava dele mas não conseguia dançar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não raras vezes as raparigas
olhavam como que a escolher o rapaz. Eles também já sabiam e faziam sinal como
a marcar o lugar. Os que não viam e vinham à frente levavam “tampa”. Era assim
que se dizia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A rapariga que não dançava ou
porque não conseguia par ou mais envergonhada ficava sentada. Chamava- se a
isso um “banho de cadeira”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Alguns bailes que se faziam
tinham nome: baile da primavera, baile de carnaval, baile da pinha ou mesmo só
baile. Tudo servia para se dançar. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O baile que se fazia à tarde
era chamado de chá dançante. Acabava à hora de jantar.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
À noite, acabava de manhã
quase sempre com marchas onde se faziam comboios com toda a gente a
divertir-se. Era sinal que naquele dia, ou noite não havia mais. Hora de rumar
a casa. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A rainha do baile era
escolhida entre as raparigas mais bonitas. Colocavam uma faixa quase sempre
cor-de-rosa. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Também se faziam ao som do
gira – discos com discos de vinil. Havia um habilidoso que comandava o som e
tinha que colocar a agulha no sítio certo e na pista certa, na música que
queria.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mais tarde já eram
abrilhantados por conjuntos com as guitarras elétricas e cabelos à Beatles. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Apareceram os Delfins, Gatos
Negros e outras bandas cujo nome já não me lembra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mudam-se os tempos e as
vontades.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas como alguém dizia: o sonho
não envelhece.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Hoje fazem-se bailes para
gerações mais velhas até mesmo em discotecas. As pessoas mais velhas têm o
direito de se divertir, conversar e recordar os seus tempos de juventude.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quantas dessas pessoas não
tiveram a oportunidade e só agora a conseguiram. A cabeça e principalmente as
pernas ajudam. E fazem muito bem! <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Será que ainda se usa: a
menina dança? E porque não?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-5191023120574998962019-11-19T20:43:00.000+00:002019-11-19T20:43:02.633+00:00Bocejo<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
Fome, sono ou …… manha do dono?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O bocejo ou abrir a boca e
deixar sair toda a preguiça que se instalou sem pedir licença.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Abrir a boca muitas vezes
seguidas pode significar que estamos cansados.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas a sabedoria ou cultura
popular imprime-lhe outro significado. Claro que o céu ou inferno estão
associados. Aliás como em quase tudo o que diz respeito a estes fenómenos, se é
que podemos chamar-lhes assim.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando eu ou o meu irmão ou
mesmo outra pessoa que estivesse por perto da minha mãe e abríssemos a boca
muitas vezes era certo e sabido:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Estás cheiinha de
quebranto!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E lá ia ela com uma jarrinha
cheia de água, um pratinho branco e a almotolia de azeite. Então, sem permitir
perguntas deixava cair no pratinho que entretanto enchia da água da jarrinha. Deitava
três pingos de azeite, ao mesmo tempo que dizia uma oração meio impercetível.
Se os pingos do azeite desapareciam repetia-se a operação até os pingos do
azeite ficarem redondinhos dentro da água do pratinho branco. <span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Pronto! Quebranto tirado.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Antes da minha mãe havia a
minha avó Amélia que, em conversa me explicou como “ cortar” o mau olhado ou
quebranto Se tínhamos quebranto, isto é, se bocejávamos mais que o normal
também nos fazia sentar num banquinho e com a faca do pão, porque tinha o cabo
de madeira, passava por cima da nossa cabeça com ela. Dizia o nosso nome e lá
vinha a oração, dita em surdina: se tens quebranto, mal de inveja ou soberba,
eu te tiro com a faca do pão, com o poder de Deus e da Virgem Maria. Pai Nosso
e Avé Maria.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Se a pessoa não estava presente
ela fazia cruzes por cima de uma foto dessa pessoa, com a tal faca do pão. E
fazia isto cerca de nove vezes. A pessoa que faz, como a “ doente”, se abrem
muitas vezes a boca é sinal que o mal está a sair. Se isto acontecer não se
preocupe.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A faca com o cabo de madeira
simboliza uma adaga. Corta o mal simbolicamente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As pessoas antigas e muitas
vezes analfabetas pensavam que tudo na vida das pessoas era conectado com a
religião ou o cosmos. Era a fé que se tinha ou ainda tem que explica (ou não)
estas coisas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Bocejar? Todos bocejamos desde
os primórdios do mundo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Bocejar não é mau nem bom
apenas significa um ajuste de energias.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O bocejo indica que temos sono,
estamos cansados ou mesmo depois de uma noite bem dormida. É um movimento
muscular que se produz tanto nas pessoas como nos animais. Uma vez iniciado é
impossível interromper. A pessoa pode fechar a boca mas os músculos estão a ser
acionados pelo reflexo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Pode ser no quentinho da
lareira, no inverno, depois de uma sesta no verão, nos dias quentes, com as
cegarregas a cantar nos pinheiros. Talvez numa conferência e quando a “ coisa”
não nos interessa nada. E quando rezamos? Claro que bocejamos.
Involuntariamente mas não deixa de ser um ou uns bocejos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Talvez não saiba mas os fetos
também bocejam dentro do ventre materno.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O bocejo é contagioso? É
contagioso mas não como doença. Se uma pessoa começa a bocejar
involuntariamente todos bocejam, os que se encontram à sua volta.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E ainda: antigamente pensava –
se que se bocejássemos sem pôr a mão na frente da boca, que os diabos entravam
no corpo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Sempre a luta entre anjos e
demónios. Como a nossa gente sabe destas cosas. Estas tradições transmitem-se
sempre por via oral. De mães para filhas ou avós para as netas. Também quase
sempre são as mulheres a via de transmissão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas ainda se ouve ao abrimos a
boca: fome, sono ou manha do dono.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Afinal é verdadeiro: se temos
fome, bocejamos. Se temos sono bocejamos. Se não temos nada, apenas entediados,
bocejamos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-89388004855161102482019-11-15T14:41:00.003+00:002021-10-29T19:04:55.468+01:00Aquela máquina<br /><br />
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O meu pai chegou a casa,
colocou os livros em cima da mesa e disse:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
--Comprei aquela máquina!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha mãe levantou os olhos
da costura que tinha nas mãos, olhou o meu pai, mas não disse nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De certeza, coisa boa não
seria. Ela era pouco dada a novidades, principalmente vindas do marido.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ele voltou a dizer: -- trouxe
aquela máquina!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Então, mais para fazer a
vontade, levantou-se e foi ver.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Era um automóvel. Morris,
pequeno e preto. Por azar, ou não, tinha a matrícula AC. Logo lhe chamaram:
Antes de Cristo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ainda meio desconfiada mirou
de todos os lados, abriu uma porta, depois a outra, franziu a testa, coçou o
alto da cabeça e sem dizer mais nada declarou: <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
-- Parece-me bem! Já não
precisamos ir a pé como fazíamos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Sim. Naquele tempo íamos a pé
até ao autocarro. Ainda era algum caminho. Levávamos cerca de meia hora.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas aquela máquina foi uma boa
aquisição. Levou-nos numa primeira viagem a Fátima. Eu teria uns doze ou treze
anos. O meu irmão mais novo encaixava-se em qualquer lado. A Fátima, fomos como
“sardinha em lata”. Então foi assim: Ia a minha avó Amélia, a minha tia Laura,
eu, o meu irmão, a minha mãe e o meu pai. Não se desconfiava que iríamos ter
cintos de segurança uns anos mais tarde. Mas o carrinho depois de muito andar,
envelheceu!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O meu pai, professor no
colégio, não se atrapalhava às primeiras. Quando o motor não queria “pegar” os
alunos empurravam até ao cimo da ladeira comigo e ele lá dentro. Depois vinham
mais ou menos pendurados até ao fundo da ladeira numa verdadeira galhofa. Para
eles era divertido. Eu encolhida lá dentro não lhe achava grande graça. Ah!
Para eles era uma verdadeira festa.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas os anos passaram. Cresci.
O meu irmão também. Cada um de nós rumou às suas vidas noutras instituições de
ensino. O meu pai continuava a dar as suas aulas no colégio.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Outos automóveis passaram
pelas suas mãos, mas mais nenhum foi “aquela máquina”.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando, passados uns anos,
tirei a carta de condução passei a conduzir eu os carritos do progenitor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Até que um dia ….. estacionada
à porta da cozinha, estava a verdadeira máquina! Ora se foi ! <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Um Dois Cavalos! Cinzento,
lindo! Carinhosamente batizámos de Latinhas. Aquilo era mesmo só lata!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O que ele aguentou! Conduzido
por mim ….. no início de ter carta de condução! A primeira vez que o levei para
a escola foi uma verdadeira aventura. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tinha mudanças. Só tinha três
e marcha atrás, alavanca no volante. Capota de lona. Sem blindagem por baixo.
Se firmássemos a vista, víamos o alcatrão da estrada. Um tapete colocado no
chão era o único luxo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Uma vez vinha com o meu pai e
num dia de calor medonho, uma cobra estendia-se a receber todos os raios
solares. Passei por cima. Olhei pelo retrovisor e não vi a cobra, que pensava
ter atropelado. Qual quê? O meu pai sem muito alarido, disse-me para olhar para
baixo. Parei e a cabeça da cobra já se avistava junto ao acelerador, ou nos
travões, ou na embraiagem. Não sei. Saí a correr, mas o trauma da cobra nunca
me passou. Nunca mais atropelei nenhuma.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Numa outra vez ia eu na
estrada e a minha mãe disse que não queria ir pela principal. Iríamos pela
secundária ali ao lado. Sem olhar bem, guinei para onde queria ir. Resultado:
Saltei uma barreira com a minha mãe a gritar que nos íamos matar. Mas não matei
ninguém e outras aventuras se seguiram E que aventuras! <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing">
Aquela máquina, uma verdadeira máquina que morreu de
forma inglória de encontro á parede de um vizinho e comigo lá dentro.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span><span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins.<o:p></o:p></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-41695290677194798882019-11-14T14:55:00.004+00:002019-11-14T14:55:59.893+00:00Vizinhos<br />
<br />
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Moro na aldeia. Pensando bem
sempre morei na aldeia. Não esta onde agora estou mas outra ou outras.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não são todas iguais. Mas
todas têm vizinhos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os vizinhos também não são
todos iguais. Sempre me dei bem com todos fossem de uma aldeia ou de outra. Mas
isto também não é fácil e não é para todos. Há que manter uma filosofia de vida
que, penso, tenha necessidade do equilíbrio.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A vizinha que nos vem, já de
noite, pedir uma perninha de salsa. Outra que espreita por detrás da cortina
como se estivesse invisível. Há as que, porque o menino deu uma volta de
bicicleta, tirou o vaso das flores do lugar. Há as que ralham por tudo e por
nada.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
É a aldeia onde tudo se sabe. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O galo canta de manhã cedo
quando o padeiro deixa pendurado num prego na porta, o pão do dia. As ovelhas
que saem da corte para o pasto com o pastor de cajado na mão. Elas seguem já
com o caminho sabido de tanto calcorrear. O pastor leva-as com um palavrão
deitado ao ar como se elas o entendessem. O cão é o companheiro da jornada
tanto do pastor como das ovelhas. Lá andam pelo mato a tasquinhar as pontas das
ervas verdes. No fundo do saco de linhagem vai o almoço dos dois: pastor e cão.
Broa, um naco de chouriço, uma garrafa de vinho. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando cai a noite, as ovelhas
e pastor regressam a casa, fartas e de barriga cheia. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A vizinha aproveita e com o
ouvido alerta, escuta o que se passa em casa da outra vizinha. Interessada em
saber se o homem da casa já chegou ou se vinha com um copo a mais.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Na cidade ou na vila estas
situações ou não se passam ou também ninguém dá conta delas. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Na aldeia não é assim. Quase
todos pertencem à mesma família mesmo os que não são, passaram a
considerarem-se como tal. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
São primos ou compadres.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Na aldeia as raparigas ou os
rapazes casam e ficam a viver perto dos pais. É um hábito antigo, que se vai
perdendo com o tempo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Semeia-se o grão e este
germina até à colheita. Sempre em vigilância permanente dos donos. Na colheita
quase todos colaboram. Lembro-me das descamisadas do milho feitas na eira. Toda
a gente ajudava. Quando a espiga vermelha aparecia era um abraço, de quem a
encontrava, a todos os presentes. Um rapaz, ou até a rapariga, espertos,
levavam uma dessas espigas no bolso para ir dar o abraço da “praxe”. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As debulhas também eram uma
festa semelhante. Todos os vizinhos se reuniam em constante ajuda. No fim e
para “rematar” as colheitas fazia-se o bailarico. A eira que serviu para a
descamisada ou debulha era transformada em sala de baile. As saias rodopiavam
enquanto elas se perdiam nos braços do rapaz, namorado ou não. Tudo isto
supervisionado pelas mães atentas, ou não, na conversa com a comadre. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Era ali que numa conversa dita
inocente entre elas que saiam as novidades. Tudo era, ou ainda é, esmiuçado até
à medula.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os homens entretinham-se na
taberna improvisada numa mesa com toalha de plástico, “manhosa” dos pingos de
vinho caídos dos copos cheios, atravessados aqui e ali pelo palavrão dito para
se afirmar de entre os outros homens.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Conversa de comadres é outra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Sabias que a Joaquina
namora com o Fernando? <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Eu não! Fingia- se admirada,
quando já estava fartinha de saber.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A outra sem querer ficar sem
uma novidadezinha ripostava:<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ A Francelina apareceu de “
barriga”. Sabes quem é o pai? Ela nem namora!<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Não sei, não! <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A aldeia é mesmo assim. Podem
mudar as pessoas, adquirir outros hábitos mas no fundo, nada muda.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins<br />
<o:p></o:p></div>
<br />
<a href="https://scontent.fopo3-2.fna.fbcdn.net/v/t1.15752-0/p280x280/75210754_754143155087506_1283691185616977920_n.jpg?_nc_cat=102&_nc_oc=AQk8EJ2zvEdsRVfzfR-xlDvNJx0dCxoOy-pnbcJpZ6zp0uDXSR3GHzJ8EUkOUnaR3O8&_nc_ht=scontent.fopo3-2.fna&oh=43925510d82ba70522531b43d271dd77&oe=5E5ED3F3" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="https://scontent.fopo3-2.fna.fbcdn.net/v/t1.15752-0/p280x280/75210754_754143155087506_1283691185616977920_n.jpg?_nc_cat=102&_nc_oc=AQk8EJ2zvEdsRVfzfR-xlDvNJx0dCxoOy-pnbcJpZ6zp0uDXSR3GHzJ8EUkOUnaR3O8&_nc_ht=scontent.fopo3-2.fna&oh=43925510d82ba70522531b43d271dd77&oe=5E5ED3F3" /></a><br />
<br />
<br />
<br />
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-86027157703857107582019-11-13T18:44:00.000+00:002019-11-13T18:44:03.022+00:00A senhora do Testinho<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não imaginam como eram os
serões em casa da minha avó, no Portugal profundo, encravado na serra. Sem eletricidade.
A fogueira ao canto da sala. O lume iluminava mais do que a luz trémula do
candeeiro de petróleo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A meio da tarde entrava a comadre
Guilhermina que a pretexto de perguntar à minha avó de como fazia as empadas.
No dia seguinte iria para casa dela o sapateiro. Precisava de aprender como se
cozinhavam. Ela até sabia, mas assim tinha conversa e, algumas vezes, nem a
receita saía. A minha avó cheia de paciência repetia pela milésima vez, ou
mais, que primeira se fazia a massa com farinha, azeite, ovos, etc tec. Já a comadre
fechava os olhos encostando a cabeça à parede, confortada com o calor do lume.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O sapateiro e a costureira iam
a casa dos fregueses, fazer o seu trabalho. Então nesse dia fazia-se uma comida
melhor.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mais tarde entrava a comadre
Maria do Leitão. Alcunha que lhe assentava na perfeição. É que em nova colocou
um dedo junto à rede no curral de porco que lho decepou. Daí o alcunha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Essa chegava apressada pois
tinha deixado a ferver no “ borralho” uns ossinhos para o caldo do seu Zé. Ficava,
ficava e ficava até ser noite fechada agachada num banquinho também junto da
lareira. É que ela gostava de ouvir as histórias que a minha avó contava. Não
havia muito mais com que nos entreter contava – nos o que, também ela, ouvira
contar à luz triste do candeeiro de petróleo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Uma noite contou que ali por
aqueles lados apareceu um cavaleiro que pediu abrigo na hospedaria mais
próxima. Ia para a cidade, mas como entretanto se fez noite, deu água e comida
ao cavalo Depois de um repasto na cozinha da hospedaria.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ao terminar a ceia olhou para
um açucareiro pousado em cima da mesa. A tampa tinha a encimar uma imagem de
Nossa Senhora ladeada de anjos. Como gostou dela e sem que a dona da hospedaria
se apercebesse agarrou-a e meteu-a no bolso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Dormiu e sonhou com lutas guerras, donzelas e
campos em flor. Toda a noite cavalgou.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De manhã, colocou as rédeas, a
sela, as esporas e fez-se aos montes na serra juncada de mato e tojos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
À medida que ia cavalgando, o
seu cavalo transformava-se em javali. Já quase sem se equilibrar, agarrava a
crina do javali. Tudo o que pertencia a arreios do cavalo tinha desaparecido.
Ele cavalgava, cavalgava direito ao infinito, tendo apenas à sua frente os
cornos esticados de um diabo feito javali.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De súbito levou a mão ao
bolso. Encontrou a tampa do açucareiro e a imagem nela estampada e a plenos
pulmões gritou: -- Valha-me a Senhora do testinho que tenho aqui no bolso.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O javali estacou. E tal como
se transformou em diabo voltou a ser cavalo com arreios e estribos.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Respirou fundo, o cavaleiro.
Era de novo o cavaleiro de antes.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Eram estas as histórias que
nós ouvíamos enquanto a comadre Guilhermina acordava e a Comadre Maria do
Leitão ia para casa acabar o caldo. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Nós íamos para a cama sonhar
com todas estas histórias fantásticas contadas ao serão no Portugal profundo
que já não existe.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<br />Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-43742699071204224612019-11-13T17:37:00.001+00:002019-11-13T17:39:12.523+00:00Desenhos animados<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Sempre que tenho os netos em
casa levo com uma overdose de desenhos animados. De todas as espécies.
Coloridos, a preto e branco, com orelhas grandes, corninhos, dentuças grandes,
óculos etc etc.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Há desenhos para todos os
gostos conforme o público. Se os espetadores forem mais pequenos os bonecos são
muito básicos e com falas tão fáceis que eles percebem tudo. O cenário é no
jardim onde as árvores ganham vida, olhos e falam, também. Há Arvores que
ganhando pernas mudam de sítio e são dos maus ou dos bons, como eles lhes
chamam. Há príncipes e princesas, um dragão com escamas reluzentes e, claro, a
espada que lança labaredas.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os maus são castigados com
espadas de fogo. Os bons têm olhos grandes, óculos e as meninas cabelos loiros
e compridos quase até aos pés. Os bons são recompensados quase sempre com uma
canção e o episódio termina.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Admiro quem desenha, faz a
produção e quem “dobra” para que as falas coincidam com a boca da personagem.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Há guerras e choros assim com
risos e cantigas. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De vez em quando, com a casa
em silêncio, há uma gargalhada que surge de um sofá onde uma das crianças se
afundou. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Até eu gosto de ver os
desenhos animados. Entro com os meus netos dentro da televisão e também faço
parte da brincadeira.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
É engraçado ser criança. Para
eles aquilo faz parte da génese e também eles entram de cabeça dentro da
televisão. Se preciso ficam ali uma tarde inteira.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não ouvem o que os rodeia. Falamos
e é como se falássemos para a parede. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No meu tempo de criança era
tudo muito diferente. Em primeiro lugar não havia televisão. Brincávamos na rua
também com castelos, príncipes e princesas forjados em cada árvore, pedras ou
mesmo a própria rua. Jogos de futebol onde as balizas eram os chinelos meio
enterrados na terra. Sem jogadores certos e sem tempo também. Acabava quando
chamavam para jantar. Sem ganhadores ou perdedores e sem árbitro. Nem treinador.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No meu tempo de criança já
havia umas publicações com desenhos e figuras que ganhavam vida nas nossas
cabeças fazendo nós mesmo o filme conforme a nossa imaginação. Nem era mau. Havia
uma que colecionámos, eu e o meu irmão, quase todos os episódios. Era o
Cavaleiro Andante. Quem não conhece? Muita gente, colecionou. As figuras
desenhadas ganhavam vida. Corriam quase sempre a cavalo. Um cavalo branco e as
crinas ao vento. E cada quadradinho era uma fonte para a nossa imaginação. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas o que teve mais longevidade
foi sem dúvida o Tio Patinhas que ainda hoje faz as delícias de miúdos e
graúdos. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Tio Patinhas assim chamado
pelo sobrinho Pato Donald.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Personagem americana é uma
série criada em histórias aos quadradinhos. É o pato mais rico do Mundo e tem
uma fortuna que faz dele o dono de um vasto Império. Os Irmãos Metralha, quem
se lembra? São uma quadrilha de ladrões, sempre atrapalhados e também sempre
metidos em apuros. Eles tentam roubar a caixa forte do Tio Patinhas. É que,
sendo ele assim tão rico faz a cobiça dos Metralha e não só. Ele também tem
medo da Bruxa Patólica, sempre à espreita de ficarem com a fortuna guardada
numa caixa forte dentro de uma banheira onde o tio toma banho ou anda de barco.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quem é o Tio Patinhas?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Do que me lembro, começou, a
trabalhar como engraxador e ganhou a sua primeira moeda. A nº 1, ou seja: a sua
moeda da sorte que guarda religiosamente. <o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Conta e limpa as moedas todos
os dias.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Estes desenhos animados foram
inicialmente feitos em histórias aos quadradinhos nuns almanaques e com o
correr do tempo foram sendo adaptados tanto ao cinema como à televisão.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O autor criou, ainda, alguns
familiares como a Vóvó Donalda,os sobrinhos Huguinho, Zezinho e Luisinho. O
Professor Pardal, Gastão,e o irritante vizinho Donald, sempre à espreita.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não me posso esquecer do
Mikey.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Aventuras de um pato ou um
rato que ficaram para a História.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Capitão América, Asterix, o
Homem Aranha e Batman. Diferentes no estilo mas que fazem as delícias da
criançada e não só.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natércia Martins</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-56801515195740027312015-04-29T18:01:00.001+01:002015-04-29T18:01:51.425+01:00<div align="center" class="MsoNoSpacing" style="text-align: center;">
Maria da Glória</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Conheço a Maria da Glória há montes de anos. Era minha vizinha. Posso
dizer que a conheço desde sempre. Mulher de estatura pequena, magra, muito
magra. Sumida pelo trabalho.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Sempre imaginei que o cérebro dela fosse mais pequeno que uma ervilha.
Não pensa. Não vale a pena. Nada na vida dela valeu a pena.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Foi à escola, mas desde que aprendeu a ler e a escrever um pouco, o pai
levou-a para casa. Não valia a pena aprender mais. O que sabia chegava. Tinha
que ajudar a criar os irmãos. Pelo rodar da vida sempre foi assim. Sem tempo
para ela. Maria da Glória nunca saiu da aldeia.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Primeiro foi o ajudar os irmãos, lavar, passar a ferro, os animais que
lhe ocupavam muito tempo. Aprendeu com a mãe a dar “ uns pontos” na roupa,
fazer as suas saias e blusas. Se era preciso comprar mercearia, roupa ou
qualquer utensílio, o pai ou os irmãos ocupavam-se disso.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Ela não ia. Não valia a pena. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
O tempo voou tão depressa que nem deu por ele. O pai morreu e Maria
precisou de ficar a dar apoio e companhia à mãe. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
A mãe precisava de cuidados constantes que Maria se apressava a
satisfazer. Maria! Sempre a Maria.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
E o tempo foi passado sem dar por isso, como sempre. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Uma tarde quente de verão, sentou-se no degrau da casa de pedra, e viu
ao longe um homem, mais velho e quando este se aproximou, entabularam conversa.
Ele queria casar com ela. Maria olhou e pensando na mãe que deixou a dormir,
num intervalo de descanso, disse-lhe que não podia pensar em deixar a casa. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Ele insistiu, mas ela respondeu-lhe como sempre respondeu a tudo na
vida: -- Não vale a pena!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Perante a negação, ele pensou que não valia a pena insistir mais e foi
embora.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Maria ouviu a mãe chamar e foi solicita atender. Precisava de um copo
de água. Foi buscar e voltou para a cabeceira da mãe que entretanto
adoeceu. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Nunca visitou a campa do pai. Não valia a pena. Os irmãos iam lá.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
O “canto” dela era ali. Sempre ali. Sempre foi precisa ali. O trabalho
era única distracção. À noite de tão cansada colocava a cabeça na almofada e
adormecia sem sonhos. Não sabia o que eram sonhos. Não valia a pena sonhar. Nem
isso valia a pena!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Uma noite, noite alta e ainda acordada, olhando a janela viu um vulto a
aproximar-se. Era o homem que falara com ela uns dias antes. E foi aí que
Maria, começou a saber o que eram sonhos. Enrolados os dois como se fosse um
corpo só, fizeram, o que Maria nunca sonhou, porque os sonhos dela não eram
aqueles. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
E outras noites se seguiram. Maria deixava a janela encostada para que
no mansinho da noite ele entrasse e ela se entregasse ao que nem desconfiava
existir. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Mas ainda havia muito mais para descobrir.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
A mãe, doente e já com idade avançada cumpriu a ordem natural da vida e
numa noite em que Maia, sem se aperceber, e embrenhada nos braços do homem, deu
um suspiro e morreu.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Só de manhã e quando lhe iria proporcionar os primeiros cuidados se
apercebeu da morte da mãe. Chamou os irmãos. Não contou a ninguém o que fazia
noite alta, quando deslumbrada e esquecida de tudo, se entregava ao prazer que
nunca antes conhecera de tão perto. Não valia a pena contar. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
E só quando acompanhou o enterro da mãe, descobriu que para lá da sua
janela, da sua casa, havia muito mais casas, muito mais vida. Havia um mundo
que ela não conhecia.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Depois da morte da mãe ficou sozinha. O homem que a visitava deixou aos
poucos, de aparecer. Também ela, ficou por ali, sem sair para outros lugares só
porque ……… não valia a pena!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
Natércia Martins</div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: -7.1pt; text-align: justify; text-indent: 21.3pt;">
2015</div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-14310716185172249622015-04-22T15:16:00.002+01:002015-04-22T15:16:25.977+01:00<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mala de cartão</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Era dia de Reis. Cheguei com
uma mala cheia de roupa e objectos pessoais. Muito pouca coisa. O Carvalho
Araújo atracava no cais no Funchal. Nunca eu pensava que um dia iria para uma
ilha dar aulas. Mas fui. O mar imenso era muito maior que alguma vez poderia
pensar. Eu, que sempre vivi na aldeia, no interior de Portugal nunca tinha
visto um marinheiro. A farda, branca, impecável, tornava os jovens marinheiros
muito mais elegantes e bonitos. Eles eram bonitos. Seriam? Sei lá! Aos olhos de
uma mulher de vinte e poucos anos, eles eram ainda mais bonitos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Cais do Funchal, na época,
era o único elo que o ligava ao Continente. O Aeroporto seria inaugurado ainda
comigo por lá. Não havia dinheiro para pagar outro transporte que não fosse o
velho Carvalho Araújo.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando desembarquei, já perto
da noite, só vi luzes em fila e mar. Só mar!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Como saio dali? Não fazia a
menor ideia. Apenas se vislumbrava uma ideia. Como nunca gostei de dar “ parte
de fraca” apanhei ali um táxi que me levou a uma pensão cujo nome li, por acaso
num jornal, ainda no barco.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No dia seguinte dirigi-me à
Direcção Escolar para me ser distribuída uma escola. Os professores foram
sempre considerados os parentes pobres do sistema. Já naquela época. Fiquei
contente porque tinha trabalho. Fui no autocarro até um lugar onde me
informaram que teria de sair. Era ali? Claro que não! </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
À beira da estrada à espera do
autocarro estava uma senhora que pegou as malas do correio. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Fui com ela. Esperava-me uma
vereda de várias horas. Lá ao fundo o mar e o casario. No meio da vereda cavada
na rocha olhei lá para baixo. O mar Sempre o mar! Era eu a nova professora. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A sala de aulas era quase a
minha casa. Não era uma escola tradicional. Instalada num salão de um palácio
semi-abandonado apenas dispunha de um minúsculo quartinho com a cama de ferro e
uma cadeira. Sem água e luz era apenas um
candeeiro de petróleo e um fogareiro lento, velho e ferrugento a mobília
da cozinha. Os pais dos alunos disponibilizaram uma panelita e um prato. Os
talheres comprarei na única venda da aldeia. A venda cuja proprietária era a
Dulcinea tinha tudo. Batatas, feijões, couves, redes de pesca, sabão, azeite e
o correio. O correio era a cópia fiel do livro de Júlio Diniz. A senhora
transformou-se em Bento Portunhas. Abria a mala do correio. Pegava nas cartas
atadas com um cordel. Revirava de um e outro lado. Os olhos das pessoas que
entretanto iam chegando na pressa ou na esperança de notícias de um marido o
filho entretanto emigrado na Venezuela ou Canadá. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Depois desatava as cartas, lia
em silêncio, só para si, cada uma e só depois olhando para a assistência
estendia a mão dando a tão esperada carta. E eu ali, também, esperando carta de
casa. Quando chegava ao fim do maço das cartas as pessoas desanimadas rumavam a
casa cabisbaixos. Talvez amanhã!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não tinha carros. Não podiam
ir para lá. Havia uma ou duas pessoas que nunca tinham visto um automóvel.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Agora, depois de cinquenta
anos, penso no que podia ter saboreado e me passou ao lado. Saborear o cheiro
do mar que eu via da janela da escola. O mar à noite era medonho, mas lindo. Os
barquinhos de pesca pareciam que se perfilavam lá ao fundo na cortina onde o
céu se une ao mar. As luzes a piscar davam ideia de estradas e os candeeiros a
iluminar a berma. Nas noites de trovoada as faíscas caiam na água dando a ideia
que tudo ia pegar fogo. Quando me convidavam a ir ao “ calhau” á maré das
lapas, caramujos ou caranguejos era uma festa. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Cozidos ali mesmo numa panela
enorme comiam-se ali à mão. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De dia e enquanto dava aulas
as mulheres sentavam-se num banquinho à porta de casa e bordavam. Toalhas
lindas que saiam das suas mãos. Aprendi muito com elas.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Podia ter saboreado as cores
que bordavam o céu ao entardecer. As cores misturam-se como na paleta de
artista. Amarelo, vermelho, azul e roxo. Tudo ali no céu.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Director podia ter-me dado
uma escola melhor. Pois podia. Mas não deu. Ali fiquei até ao fim do ano com
algumas peripécias pelo meio.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Hoje, com as vivências que
tenho e a idade também, talvez tivesse saboreado de outra forma.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E eu a dormir naquele
quartinho minúsculo enquanto o resto do palácio se encontrava vazio. Um dia
depois das aulas deu-me a curiosidade e abri uma porta que se encontrava no meu
quarto. Os móveis com algum pó e cobertos de lençóis brancos, estilo muito antiquado,
esquecidos no sobrado velho e carunchoso. Os donos viviam na cidade. Desci as
escadas interiores e deparei com a capela. No altar a Pietá de mármore com o
Cristo ao colo, morto, era de uma realidade incrível. Que maravilha! Mas o
arcaz dos paramentos chamou-me a atenção. Com cuidado levantei o tampo para ver
melhor. Os ditos paramentos tinham rendas e bordados feitos certamente pelas
senhoras que moraram ali. Agora, o palácio deserto, apenas cuidado pelo Senhor
Gerónimo, homem já grisalho, que gostava de conversar. Quantas tardes ficámos
ali no pátio do solar a ouvir histórias de baleias e tubarões que, se calhar,
nunca deram à costa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Sr. Gerónimo era bom
contador de histórias e ainda me aguçou mais a curiosidade de ver o que havia
dentro do solar e daquele arcaz. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Com o maior cuidado levantei a
tampa de uma caixa que estava no meio dos paramentos. Lá bem no fundo, ainda na
capela. Uma criança mumificada. Quantos anos teriam? Muito, muito antigo! Era
hábito nas ilhas, quando o morgado do solar falecia à nascença, ou pouco mais
tarde, tratavam de forma a mumificar o corpo na capela.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Fugi escada acima com medo.
Nunca mais desci as escadas e muito menos alguém soube que “ visitei” o solar.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Passados quase cinquenta anos
voltei lá. Já fui de automóvel. A senhora Dora já não leva as malas do correio.
O solar sofreu obras. Há um passeio pedonal junto ao “ calhau” onde coziam os
caranguejos, os caramujos e as lapas. Hoje é praia de surfistas. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A escola é num edifício
próprio. Perdeu a magia dos meus vinte e tantos anos ? Não! Apenas evoluiu!!!! </div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-91701275088834819042015-04-06T18:44:00.001+01:002015-04-06T18:44:27.852+01:00<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Desilusão</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tarde quente de verão.
Sentei-me na esplanada em frente a um grupo de homens que, sentados na mesa em
frente bebiam e conversavam. Impecáveis no fato cor de cinza e camisa branca. Deveriam
ter trinta a quarenta anos. Bebi um refresco e fiquei a pensar nas notas do
último período de aulas, dos meus alunos. Havia alguns que não iriam passar de
ano. Culpa deles que não estudaram o suficiente ou culpa minha que não me fiz
entender e explicar as aulas convenientemente? Uma dúvida que sempre que o ano
findava, se me colocava. Ano após ano.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Acabada a bebida foram-se
levantando e depois de um cumprimento, saíram e rumaram a casa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Levantei a cabeça e vi que um
ficara sentado a olhar me. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Desvalorizei. Os meus alunos
enchiam-me, naquele momento, todos os pensamentos. Levantei-me e dei a volta ao
quarteirão e fui para casa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O homem tinha uns fiozinhos
brancos de cabelo a espreitar por entre os outros ainda negros. Isso ficou me
na cabeça, embora não tenha dado grande relevância à pessoa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Por curiosidade, fui de novo à
esplanada. Fui ver se encontrava o mesmo grupo embora nunca os tivesse visto
por ali. Não! Apenas um. O dos fiozinhos de cabelos brancos, com um copo de
limonada na mão. Entabulou conversa perguntando se eu gostava do verão. Ele não
gostava muito do calor, mas que não havia outro remédio. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mais um dia. Outro dia e fomos
conversando do calor, das aulas, do trabalho dele, dos meus alunos, de outras
banalidades.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Fomos falando e pouco a pouco
fomos aproximando as nossas vidas e as nossas conversas.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tão boa a sua companhia, a sua
mão na minha, os lábios tão quentes e até o seu bafo me confortava. Passámos a
sair juntos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O tempo foi-nos aproximando e
nós gostávamos. Dei por mim apaixonada. A paixão existe? Não faço ideia. Mas
aquele sentimento não podia ser outra coisa, pois passei a deixar de pensar
tanto nas aulas. Sempre ele. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quando à noite ele me sentava
nos joelhos e me abraçava, eu ficava sem pensar em nada. Só aquele cabelo e os
olhos grandes e lindos me enchiam a alma e o ego. E eu gostava sempre. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Cada centímetro da sua pele
respirava sensualidade. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Uma tarde, enroscados junto à
lareira, em minha casa, porque a noite estava fria, contou-me de uma relação
antiga. Foi mau. Deixou marcas. Chorou e eu chorei com ele. Uma traição não se
esquece com facilidade. Ele tinha sido vítima de uma traição. Mal eu sabia …….</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Consolei-o, não só naquela
noite mas em muitas mais que se seguiram. Como ele se mostrava meigo! Os olhos
lindos, cada vez mis lindos, rasos de lágrimas, ia contando como fora amargo encontrar
os dois, numa manhã, deitados lado a lado na mesma cama onde ele e ela dormiam.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A cabeça pousada nos meus
joelhos. Imagino o que sentia e talvez sem eu querer, foi assim que me
apaixonei.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os dias e as noites foram
passando, ora na minha casa ora na dele. De vez em quando íamos passar a tarde
que restava no fim das minhas aulas e do trabalho dele. O grupo mantinha-se por
ali, fazendo eu também parte dele, agora. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Eram divertidos, mas também já
não seria por muito mais tempo pois o contrato da Empresa onde trabalhavam iria
findar. Cada um rumaria às suas casas e a outros contratos noutras terras. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Nunca coloquei a hipótese dele
ir também. Nunca perguntei, como nunca perguntei porque razão um dos do grupo
ficava tantas vezes para jantar em casa dele. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Numa das noites que fiquei em
minha casa sem ele, vi que me esquecera da agenda em casa dele. Pronto! Teria de
ir buscá - la de manhã. Precisava de dar notas e tinha aí tudo guardado.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Levantei-me um pouco mais cedo.
Corri na esperança de o encontrar ainda deitado. Abri a porta. Pelo chão havia
roupa espalhada e copos vazios em cima da banca da cozinha. Fui direita ao
quarto e ali, na cama dele, juntinhos os dois amigos ainda abraçados dormiam
depois de uma noite louca. Não deram por mim. Agarrei a agenda e corri direita
a minha casa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Meti a chave na fechadura que
se abriu com um clic meio silencioso, meio chato. Não queria que me ouvissem.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Peguei nos sapatos, agarrei-os
pelos saltos como se lhes quisesse apertar o pescoço. As lágrimas correram - me
pela face enquanto subia as escadas. Sentei-me no último degrau e a cabeça
vagueou mais uma vez. Era o fim. Revi mais uma vez a mesa da esplanada onde nos
conhecemos, o amigo que ficava para jantar, a lareira onde me contou da traição,
e por fim como os vi aos dois na cama, deitados lado a lado nos mesmos lençóis
onde dormíamos. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<i>Natércia Martins<o:p></o:p></i></div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<i>2015 <o:p></o:p></i></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-85985735773111961992015-02-19T22:15:00.001+00:002015-02-19T22:15:37.194+00:00A Senhora do testinho<div align="center" class="MsoNoSpacing" style="text-align: center;">
A Senhora do
testinho</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Não imaginam como eram os
serões em casa da minha avó, no Portugal profundo, encravado na serra. Sem
electricidade. A fogueira ao canto da sala. O lume iluminava mais do que a luz
trémula do candeeiro de petróleo. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A meio da tarde entrava a
comadre Guilhermina que a pretexto de
perguntar à minha avó de como fazia as empadas. No dia seguinte iria para casa
dela o sapateiro. Precisava de aprender como se cozinhavam. Ela até sabia, mas
assim tinha conversa e, algumas vezes, nem a receita saía. A minha avó cheia de
paciência repetia pela milésima vez, ou mais, que primeira se fazia a massa com
farinha, azeite, ovos, etc etc. Já a comadre fechava os olhos encostando a
cabeça à parede, confortada com o calor do lume.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O sapateiro e a costureira iam
a casa dos fregueses, fazer o seu trabalho. Então nesse dia fazia-se uma comida
melhor.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mais tarde entrava a comadre
Maria do Leitão. Alcunha que lhe assentava na perfeição. É que em nova colocou
um dedo junto à rede no curral de porco que lho decepou. Daí o alcunha.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Essa chegava apressada pois
tinha deixado a ferver no “ borralho” uns ossinhos para o caldo do seu Zé. Ficava,
ficava e ficava até ser noite fechada agachada num banquinho também junto da
lareira. É que ela gostava de ouvir as histórias que a minha avó contava. Não
havia muito mais com que nos entreter contava –nos o que, também ela, ouvira
contar à luz triste do candeeiro de petróleo.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Uma noite contou que ali por
aqueles lados apareceu um cavaleiro que pediu abrigo na hospedaria mais
próxima. Ia para a cidade, mas como entretanto se fez noite, deu água e comida
ao cavalo Depois de um repasto na cozinha da hospedaria.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ao terminar a ceia olhou para
um açucareiro pousado em cima da mesa. A tampa tinha a encimar uma imagem de
Nossa Senhora ladeada de anjos. Como gostou dela e sem que a dona da hospedaria
se apercebesse agarrou-a e meteu-a no bolso.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Dormiu e sonhou com lutas guerras,donzelas e
campos em flor. Toda a noite cavalgou.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De manhã, colocou as rédeas, a
sela, as esporas e e fez-se aos montes na serra juncada de mato e tojos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
À medida que ia cavalgando, o
seu cavalo transformava-se em javali. Já quase sem se equilibrar, agarrava a
crina do javali. Tudo o que pertencia a arreios do cavalo tinha desaparecido.
Ele cavalgava, cavalgava direito ao infinito, tendo apenas à sua frente os
cornos esticados de um diabo feito javali.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
De súbito levou a mão ao
bolso. Encontrou a tampa do açucareiro e a imagem nela estampada e a plenos
pulmões gritou: -- Valha-me a Senhora do testinho que tenho aqui no bolso.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O javali estacou. E tal como
se transformou em diabo voltou a ser cavalo com arreios e estribos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Respirou fundo, o cavaleiro.
Era de novo o cavaleiro de antes.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Eram estas as histórias que
nós ouviamos enquanto a comadre Guilhermina acordava e a Comadre Maria do
Leitão ia para casa acabar o caldo. </div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Nós iamos para a cama sonhar
com todas estas histórias fantásticas contadas ao serão no Portugal profundo
que já não existe.</div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-11756155195599405312014-10-20T21:21:00.002+01:002014-10-20T21:21:27.496+01:00<div align="center" class="MsoNoSpacing" style="text-align: center;">
O moinho</div>
<div class="MsoNoSpacing">
O meu vizinho, pedreiro de ofício, homem de uma
imaginação fértil, conta histórias de bruxas, lobisomens e pessoas, tão antigas
como o tempo em que se lembra de viver.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O degrau da minha porta
continua a ser uma espécie de esplanada à noite, quando depois de jantar
ficamos na conversa. Hábito já velho. Mas são giras as suas histórias e eu
gosto de o ouvir.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Natural de uma povoação
vizinha é de lá que traz as memórias mais antigas. Depois de sair da escola, o
que naquele tempo era recorrente, começou por ser moleiro como o pai.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Com um macho e a carroça percorria
os campos de Montemor, Arzila, Figueiró do Campo.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Franzino, de pouca idade,ia
fazendo as entregas como podia e sabia.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O moínho, pertença do pai moía
o milho trazido nos sacos e taleigas para serem tranformados em farinha.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Em casa havia broa. Havendo milho, havia broa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O moínho nunca parava girando
pela força da água que caía em levada pela rampa do rodízio.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A terra é farta de água mas
faltam-lhe já os moínhos que, um a um, se foram calando, pela idade dos
moleiros, que, também, um a um nos foram deixando.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O meu vizinho já não é
moleiro, mas as histórias ainda lhe povoam a cabeça.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Conta que ainda ouve os
rodízios que fazem girar as mós. Sonha com o pai a deitar o milho dentro da
moega e o chamadouro ( ou tangedor) a obrigar o grão a escorregar na quelha até
cair na mó, que mói, transformando o cereal em farinha.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E lá no fundo do moínho, por
entre sacos de farinha e grão espreitava um rato ou vários ratos, porque todos
sabemos que onde há farinha ou grão, há infalivelmente ratos, que matreiros escapam
ao olhar e ouvido apurado dos gatos agachados, mudos, quase mortos de tanta
quietude, prontos a saltar por cima da presa.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
As mós rolavam, numa cadência bruta
a moer o milho trazido nas taleigas amontoadas na carroça da mula à espera do
carreto do dia seguinte.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O senhor Augusto, pai do meu
vizinho, foi moleiro desde sempre. Nasceu entre sacos de farinha, de grão e de
mós. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Homem de grande estatura. Com
quase dois metros de altura. Cento e vinte quilos. Broa e sardinha assada no
braseiro da lareira. A acompanhar a sardinha a pingar em cima da fatia grossa
da broa, nos dedos negros, sujos do picão, pois a mó precisava, de vez em
quando, de ser picada De tanto moer, gastava-se.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas o meu vizinho, de boa
memória, contou que num dia de Outono, já o campo pedia lavoura, as cegarregas
já se calaram no seu torpor de começar a hibernar. Sentado num saco de milho a
obsrevar o moínho, a mó e a moega, que sem se cansar continuavam no seu labor,
enquanto à frente dentro da gamela de madeira gasta por anos e anos de uso, caía
a farinha numa cadência certa, branca em chuva, pintando tudo em volta da mesma
côr.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Então o Senhor Augusto chamou
a mulher e disse-lhe que no dia seguinte precisava de almoço para ele e quatro
homens que iriam cavar um campo a fim de preparar a terra para semear milho.
Muito bem. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A mulher de estatura franzina,
contrastando com o marido, cozinhava bem e para aqueles dias de gente “de fora” fazia uns petiscos de comer e chorar
por mais. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ainda de madrugada o bom do Sr
Augusto levantou-se, pegou na enxada ao ombro. Os outros homens levariam as
deles. A terra era grande. Levava o dia inteiro com ele e os quatro homens a
cavar. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Chegou, pegou na enxada e foi
adiantando o trabalho. Em casa o galo cortado em bocados, lourinhos da assadura
no forno, arroz branco, chouriço, pão assim como o vinho no garrafão.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Tudo na cesta grande ao fundo
da terra esperava pela hora de almoço.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quem transportou tudo isto foi
a “ Ti Maria Fresca” mulher do Sr. Augusto, mãe do meu vizinho.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Enquanto ia pelo caminho,
passou por uma figueira com figos, pingo de mel. Poisou a cesta. Foi aos figos.
Tinha dentes postiços. Como se sabe os figos são inimigos de quem usa este tipo
de dentadura. As bolinhas metem-se nos dentes, por baixo, pelas fendas. A
mulher para se deliciar, tirou a dentadura e deixou-a em cima de umas folhas de
couve. Quando já tinha a barriga cheia de figos, bem procurou os dentes, mas
estes desapareceram, provavelmente levada pelos gatos. Nunca mais teve dentes.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O Sr Augusto cavava, cavava e
os homens que não chegavam ao trabalho. Aliás nunca chegaram. O homem cavou
tudo sozinho. As bagas de suor escorriam-he na nuca, mas ele não parava. Queria
tudo cavado. No fim do dia olhou para a terra toda cavada, com as leiras
direitinhas, sentou-se numa pedra e se tinha cavado tudo sozinho também tinha
direito a comer. Foi o galo, o arroz, o pão, o chouriço e o vinho. Não sobrou
nada do que era para todos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Deitou-se e dormiu. Amanhã
seria outro dia. O moinho continuaria a moer o milho e a farinha iria cair,
como sempre, na gamela de mdeira em chuva, pintando de branco tudo ao redor,
como sempre. O macho, no pátio, esperava por mais um carreto. Sempre o mesmo
todos os dias.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 247.8pt; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
Natércia Martins</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 247.8pt; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
2014</div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-89485139024957430392014-10-05T17:51:00.001+01:002014-10-05T17:51:09.211+01:00<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<u>Gaitas de capador<o:p></o:p></u></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A tradição tansformou-se em
rotina ou a rotina é que se transformou em tradição.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Lá pela manhã bem cedo os
homens juntavam-se na porta da cozinha onde a empregada ou a minha mãe trazia
um copo e a garrafa da aguardente, guardada e sempre cheia, no armário da
cozinha.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A aguardente feita pelo tempo
das vindimas, quando o meu pai, de calças arregaçadas carregava o caldeirão do
alambique de cobre com os restos que saiam dos pipos. Não confiava a tarefa da
aguardente a ninguém.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A bica feita com uma pequenina
peça de pau de oliveira, entalada no cano apenas pingava, e o vapor da borra se
transformava em deliciosa aguardente de vinho. Tantas vezes eu ou o meu irmão
ficámos de guarda à fogueira que alimentava o alambique.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Lembro-me que pelos meus 17 ou
18 anos tinhamos combinado um bailarico numa aldeia vizinha O tempo não passava
e a bica, pingo, pingo. Vai de deitar lenha na fogueira. Fez-se num abrir e
fechar de olhos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Pois! O pior foi a graduação.
Fraquinha !</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O meu pai não se preocupou
muito. Deitou tudo lá para dentro de novo. Agora fazem como deve ser. Lá se foi
a festa. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Seria por isso que os homens gostavam de
começar o dia de trabalho na quinta com um copinho cheio? Talvez|</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha mãe destinou o dia
para a matança do porco. Este era tratado e engordado lá em casa com produtos
da quinta. Sempre gordos.Muito gordos! O porco era trazido até à eira onde o
aguardava o banco próprio, os alguidares para o sangue, a gamela para as tripas
e todo o interior. Tudo se aproveitava. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Seguia-se o trabalho inerente
à sessão. Porco morto, copo de tinto bebido por cada pessoa que ali estava. As
mulheres incluídas.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Depois, já nas lages da eira,
chamuscava-se com tojo recolhido na mata uns dias antes. Mais um copo. O que se
seguia: lavar, raspar o courato, limpar, tirar as unhas ( a que chamavam
castanholas e as raparigas solteiras mandavam, por graça aos rapazes, por
alturas do Carnaval, a gozar com eles), fazia-se sempre da mesma forma. Tarefas
inerentes às mulheres.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O porco pendurado no chambaril,
na trave da adega. Mais um copo. O pipo estava ali mesmo à mão. Pronto! Até ao
dia seguinte não havia muito mais a fazer. O meu pai não gostava quando da
matança do porco e este já pendurado, a minha mãe, de mansinho, abria a porta e
de faquinha na mão retirava bocadinhos, dizia ela, que não faziam falta, mas
fritava para o jantar.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No outro dia era o desmanchar,
fazer morcelas ( que na minha terra levam canela) cortar a carne e temperar os
chouriços, salgar os presuntos. Enfim ! uma data de coisas que na sua maioria
já nem me lembro.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha mãe andava sempre por
perto, pois cada pedaço tinha a sua finalidade. Outrora havia o costume de
levar aos vizinhos de mais perto a “ assadura”. Esta consistia em pôr num prato
uma morcela, um pedaço de lombo, um rim ( conforme se sabia que a pessoa
gostava ou não), figado, entretinho e sangue cozido. Coberto com um paninho,
levava-se ao vizinho próximo ou à pessoa importante da aldeia. Dava uma dose de
sarrabulho.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O animal já retalhado e
cortado para os chouriços Estes ficavam em tempero os dias precisos, De seguida
iam para o fumeiro. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Já a minha mãe, sempre ela,
tinha rapado, bem rapadinho as costelas, ou entrecosto, que partia em
bocadinhos. Infalivelmente havia arroz de entrcosto. Infalivelmente, por alguns
anos, o meu pai fartinho de saber como ela deixava os ossos chamava o meu avô,
ainda vivo, na altura:</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Sr. Guilhermino ! Venha
jantar. Temos gaitas de capador!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Ainda hoje, ao entrecosto
chamamos gaitas de capador. Já lá vão tantos anos! Já não matamos porco, mas as
gaitas de capador, não tão rapadas, em minha casa, subsistem.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E a cabeça do porco ? Tinha a
sua função na matança. Um cozido: batatas, couves, nabos, cenouras e a cabeça
do porco, faziam as delícias. Dizia-se ir comer a cachola.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Do bucho ainda se faz um
cozinhado saboroso. Depois de bem lavado e tratado enche-se com bocadinhos de
carne, chouriço, galinha e outras carnes. Cozinha-se e põe-se arroz, sumo de
limão e ovos batidos. Vai ao forno a alourar. Acreditem que é um petisco !</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Era um regalo chegar ao
borralho e ao olhar o fumeiro, os chouriços, as farinheiras ou os paios,
enfileirados lá em cima. Certinhos nas varas até ficarem bons para mergulhar em
grandes potes de barro cheios de azeite, vindo do lagar, ainda a cheirar a
novo. O velho que saía desses mesmos potes e já não servia, era utilizado na
“lavagem” para engordar outros porcos. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O mesmo ritual. As mesmas
pessoas. Os mesmos utensílios. Tudo igual ano após ano.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No presente nada disto se faz.
Até o costume de levar a “ assadura” ao vizinho se perdeu. Mudam se os tempos ! </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Também se mudam os vizinhos !</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Costume antigo de aldeia
perdida na serra. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Costumes de outros tempos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 283.2pt; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<i>Natércia Martins<o:p></o:p></i></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 318.6pt; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<i>2014<o:p></o:p></i></div>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-3514516095504277972014-06-23T16:59:00.001+01:002014-06-23T16:59:40.680+01:00Papa figos<div align="center" class="MsoNormal" style="text-align: center;">
<u><span style="font-size: 16.0pt; line-height: 115%;">Papa figos</span></u><span style="font-size: 16.0pt; line-height: 115%;"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A quinta da minha avó era um
paraíso. Foi lá passada toda a minha infância e adolescência. Com o meu irmão,
mais novo cinco anos, experimentámos tudo o que a natureza nos proporcionou: o
cheiro das maçãs, da erva molhada, do milho acabado de colher, da broa a sair
do forno e partida à mão, com sardinha salgada assada na cinza. O sabor da
fruta fresca ainda pendurada nos galhos verdes das árvores. Os sons do canto
dos pássaros, das ovelhas a pedir agasalho no curral.O sino com o repique
depois do casamento dos meus vizinhos, ou o toque lúgrube do funeral. Não
esqueço o som do sino que ao começar ou findar do dia tocava as três badaladas
das trindades convidando à oração breve.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Viver na aldeia é isto tudo:
Viver os cheiros, os sons e os sabores. Vivi isto tudo na minha infância.
Primeiro com a minha avó. Depois da sua morte os meus pais mudaram-se para a
quinta. Eu por lá fiquei com eles e o meu irmão que sempre me acompanhou até as
nossas vidas se modificarem.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
No inverno e a azeitona
espreitava no cimo das oliveiras, davamos uma volta e apanhávamos cogumelos
grandes, castanhos que por lá se chamam gasalhos. O pés das oliveiras eram um
sítio húmido e com algum musgo. Era aí que eles estavam. Nós sabiamos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha mãe, em casa,
fritava-os com ovos. Que petisco!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A minha cabeça é formada por uma amálgama de
cheiros e sons desses tempos. Até o som do silêncio se instalou. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Entre as muitas árvores que
havia na quinta destacavam-se as figueiras. Havia muitas e de várias
qualidades.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Nas férias havia visitas.
Penso que iam para a quinta para fugir do bulício da cidade, dos automóveis e
saborear aquele lugar calmo e rural. Ali não havia mais nada. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Havia, também, as histórias
fantásticas contadas nas noites de inverno, à volta da camilha e uma braseira
no estrado redondo. Hoje a mesa é minha
e quando me sento lá recordo com saudade tanta gente que por ali passou. Meu
Deus! Tanta gente!</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Quem gostava de passar uns
tempos na quinta, vindo de Lisboa, era um tio da minha mãe. O tio Augusto. Juiz
desembargador, muito alto e com uma barriga grande e disforme que os meus
primos tinham medo que um dia desse um estoiro. Nunca deu.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Gostava de se sentar na
espreguiçadeira à porta da cozinha. Lá passava tardes inteiras, ora cochilando
em pequenas sestas, ou mesmo preguiçosamente escutando os barulhos próprios da
quinta e dos afazeres dos empregados.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Um dia no meio de um cochilo
passou um criado com uma cesta de figos, lindos, frescos e luzidios. Chamou-o:</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Anda cá. Dá-me um figo.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
O rapaz respondeu pronto,
enquanto pousava a cesta no chão:</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
__ Sr. Marques. Pode comer à
vontade. É que são para os porcos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Deu uma gargalhada o meu tio e
comeu mesmo à vontade.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Na quinta havia três figueiras
tão juntas que os ramos se entrelaçavam. Uma dava figos pretos, outra figos “
pingo de mel” e uma outra de qualidade indefenida.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
A “ pingo de mel” era a mais
procurada. Cada figo, no fundo, tinha uma lágrima a cair, tão doce que parecia
mel. Daí o nome.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Paraíso dos papa-figos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os papa-figos são uma pequena
ave de corpo amareo vivo, asas e cauda preta. Lindos! De canto aflautado,
confundem-se com o estorninho. Também os lá havia.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Os papa-figos pousavam ao de
leve nos ramos verdes da figueira aí pelos finais de Abril ou início de Maio.
Também ficam quando a comida abunda, e enquanto comem os figos a cair de
maduros fazem coros e até concertos com o seu canto. Quando de papo cheio e
godinhos partem em migração para terras de África onde nidificam. No ano
seguinte cá estão de novo.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mas, como dizia, os papa-figos
pousavam nos ramos da figueira e o meu pai ou o meu irmão, rapaz ainda, pegavam na espingarda de pressão de ar,
sentavam-se à janela da casa velha que servia de palheiro e apontavam ao “
passaroco”. Com um cordão atado ao trinco da porta, abriam –na e a cadela Tany,
corria a trazer –lhes o papa-figos já morto.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Que ricas merendas a minha mãe
fazia depois de depenados e fritos.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
E era assim a vida na aldeia
recôndita no meio da serra onde não havia muito mais para fazer.</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Nunca consegui fritar um “
gasalho”ou qualquer papa-figo com o
sabor que a minha mãe lhe dava. Porquê ? Não sei. Também já ninguém caça
papa-figos nem a pequena caçadeira é minha A cadela Tany morreu há muitos anos.
A quinta já não é nossa. As figueiras de tão velhas morreram e no seu lugar há
uma vivenda. Já pensei que as mãos das mães dão à comida um sabor especial. Vi,
vezes sem conta a frigideira, no fogão de lenha a borbulhar e os pedaços de
gasalho a ficarem dourados com os ovos trazidos da capoeira, a fervilhar com
bocadinhos de presunto, também trazido da salgadeira do porco morto em Janeiro.
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
Mais cheiros, sabores e sons
num turbilhão dentro da minha cabeça. </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 247.8pt; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
Natércia Martins</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="margin-left: 283.2pt; text-align: justify;">
2014 </div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-26201032719853084062014-02-10T22:21:00.000+00:002014-02-10T22:31:08.889+00:00Piloto<div>
<br />
<div style="display: inline; text-align: left;">
<div style="text-align: justify;">
O Piloto era um cão preto que havia em casa dos meus pais. Acompanhava o meu pai na caça. Não foi ensinado a trazer as perdizes à mão mas ficava parado junto da caça morta por um tiro certeiro do meu pai ou do meu irmão. O que gostava mesmo era da escola. A minha mãe dava aulas pertinho de casa. O cão ia com ela de manhã, ao início do dia. Nesse tempo as crianças levavam almoço que, na maioria das vezes se traduzia por um pedaço de broa e uma sardinha frita. O Piloto observava todas as saquinhas da merenda. Se lhe cheirava não fazia cerimónia em “atacar” a comidinha. Quando isso acontecia a minha mãe repunha a merenda. Presunto ou chouriço dentro de um pão. Quantas merendas destas foram ganhas à custa do Piloto, que ficava com a fama e não com o proveito.</div>
<div style="text-align: justify;">
Aquele cão tinha atitudes de humano. Se o era o não nunca o saberemos. Mas que tinha coisas que não eram de um ser que dizem irracional, lá isso tinha.</div>
<div style="text-align: justify;">
Quando o meu pai vinha à tarde para casa o cão ouvia ao longe o trabalhar do motor do carro e corria disparado ao seu encontro. O encontro era sempre numa lomba que há perto do pinheiro manso. Aí abria-lhe a porta e o cão subia para o banco ao lado do meu pai e sentava-se como pessoa feliz.</div>
<div style="text-align: justify;">
O cão sabia sorrir quando lhe passávamos a mão na cabeça. Olhava-nos com uns olhitos meigos a dizer: passa lá a mão outra vez</div>
<div style="text-align: justify;">
Certo dia demos pela sua falta de manhã. A minha mãe foi para a escola, mas o Piloto não apareceu. Não apareceu para o almoço. É que não falhava a hora do almoço. Não apareceu para esperar o automóvel à tarde. À noite não chegou para jantar. Ficámos preocupados. No dia seguinte também não estava. Foi aí que resolvemos ir ao pinhal onde o meu pai caçava. Era perto de casa. Depois de andarmos quase toda a manhã a “ bater” o mato e chamar por ele, lá estava, deitado com uma pata dianteira presa na armadilha que os caçadores furtivos usavam para apanhar raposas.</div>
<div style="text-align: justify;">
Todo o caminho foi feito a chorar. As lágrimas corriam-lhe no pêlo. Trouxemo-lo ao colo. Lambeu-nos as mãos e os braços como um gesto de quem beija, agradecido. Aquela pata nunca mais teve força. Corria, mesmo assim, pela quinta e sentava-se nos degraus das escadas da minha avó. Ele e eu a ver o moleiro com os burros presos uns aos outros pela arreata com os foles do grão e da farinha em cima do lombo calejado.</div>
<div style="text-align: justify;">
Era um cão já velho. O pêlo ruço pelo correr dos anos Acompanhou o meu crescimento e o do meu irmão. Era família.</div>
<div style="text-align: justify;">
Era filho da cadela da vizinha. Quando nasceu e abriu os olhitos pequeninos e muito pretos Fui espreitar. Gostava de ver todos a mamar. A mãe olhou - me e penso que me disse: Leva aquele pretinho. É tão lindo!</div>
<div style="text-align: justify;">
Talvez tenha sido um cão igual a todos os outros. Para mim foi muito especial. Era o Piloto!</div>
<div style="text-align: justify;">
Brincava comigo enquanto o meu irmão aprendia a andar de bicicleta contornando os canteiros de violetas e o grande limoeiro da quinta.</div>
<div style="text-align: justify;">
Ajudou-nos a crescer. Encharcava-nos quando se sacudia depois de um mergulho no tanque de rega. Ladrava quando tinha fome e não nos resolvíamos a ir almoçar.</div>
<div style="text-align: justify;">
Aconteceu um dia o que acontece a quem já é velho: morreu! Morreu muito velho, cego e com pouca mobilidade. Foi a enterrar embrulhado num lençol na cova funda onde o meu pai plantou uma roseira.</div>
<div style="text-align: justify;">
Nunca me vou esquecer do Piloto. O meu amigo de infância. Brincava comigo a correr na eira onde no verão se estendia o milho e o centeio acabado de colher. Aí espalhávamos as molas da roupa de dentro do balde preso num prego num pau que servia de suporte à corda. A eira também servia para pendurar a roupa. Era espaçosa e limpa quando não tinha grão a secar ao sol ou depois da debulha.</div>
<div style="text-align: justify;">
A vida continua. Todos seguimos rumos diferentes. O meu pai e a minha mãe também faleceram, mesmo não sendo velhos ainda. A quinta já não é nossa também. Mas a roseira continua no mesmo lugar como que a lembrar o velho Piloto.</div>
<br />
<div style="text-align: right;">
Natércia Martins</div>
</div>
</div>
<span class="text_exposed_show" style="background-color: white; display: inline; font-family: 'lucida grande', tahoma, verdana, arial, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;">
</span>Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-75244520887736575102013-10-29T19:40:00.000+00:002013-10-30T14:46:17.204+00:00Saltos Altos<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: center;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><u><span style="font-size: 18pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Saltos altos<o:p></o:p></span></span></u></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">O meu pai entrou em casa com uma
caixa novinha em folha, debaixo do braço. Colocou-a em cima de uma cadeira e
foi embora. <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Eu, curiosa, e pequena ainda, muito
devagarinho e sem ninguém dar por isso, levantei a tampa. Que maravilha! Uns
sapatos de salto alto. Amarelos e com um brilho que achei lindo. Luziam ainda
mais quando tirei a tampa e olhei maravilhada. Eram de verniz. Como eu gostaria
de crescer depressa para poder usar uns sapatos daqueles. Já me via empoleirada
no cimo daqueles saltos enormes. Mas ainda iria faltar muito tempo. Apenas
poderia sonhar e admirar aquela pequena maravilha.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">A minha mãe entrou em casa vinda do
trabalho e viu a caixa. Nem ligou muito. Não mostrou curiosidade. Eu fiquei
quietinha à espera que quando abrisse a caixa soltasse uma exclamação de
alegria.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Algum tempo passou e eu curiosa. E
ela que não mostrava o mínimo interesse.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Ao jantar a caixa ainda lá estava por
abrir. Que coisa! Parecia que o tempo não passava. O meu pai também não disse
nada. E a caixa fechada em cima da cadeira.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Já tarde a minha mãe notou a presença
de um objecto em cima da cadeira. Olhou para o meu pai e perguntou.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">-- Foste tu que compraste? <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">-- Sim. Fui eu. Espero que gostes.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">A minha mãe levantou devagarinho a
tampa. Olhou uma, duas vezes. Aguçou a vista, franziu o nariz. Olhou mais uma
vez. E quando eu pensava que iria sair uma explosão de alegria, ficou vermelha,
olhou para o meu pai e gritou:<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">-- Amarelos? Vou parecer que tenho
pés de canário. Nunca, na minha vida, vou usar uns sapatos amarelos. Quem
pensas que sou? Uma qualquer que usa esta “coisa” ?<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">E os sapatos lá ficaram tristes
dentro da caixa. Nunca ninguém os calçou.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">A minha mãe não gostava do amarelo. E
eu, ainda hoje, olho para a caixa dos sapatos amarelos e dou um sorriso. Uns
sapatos tão lindos, com um salto fininho que fazia inveja a umas pernas bem-feitas.
Eram lindos os sapatos ! <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">O tempo passou. Cresci mas nunca fui
capaz de os calçar. Quando mudei de casa trouxe comigo a caixa e os sapatos.
Herdei-os como outros móveis que tenho e também vieram juntamente com pequenas
lembranças.<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Saltos altos nunca me fascinaram
muito. Quando, passados uns anos e cheguei à idade de poder usar, já não me pareciam
assim tão bonitos. <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Fui a bailes e festas. Levava saltos
altos, claro, mas nunca amarelos. <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Mas penso: que ideia a do meu pai em
comprar uns sapatos amarelos para dar de prenda à mulher. E de salto alto! <o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Será que ele não sabia que ela não
gostava do amarelo?<o:p></o:p></span></span></b></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt 283.2pt; text-indent: 35.4pt;">
<b style="mso-bidi-font-weight: normal;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;"><span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: Calibri;">Natércia Martins <o:p></o:p></span></span></i></b></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-91080282600839246802013-04-07T16:51:00.002+01:002019-11-24T17:53:49.187+00:00Na Quaresma<br />
<div align="center" class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: center;">
<span style="font-size: 16pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Na quaresma<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A religiosidade nem sempre foi vivida da mesma forma. Evolui.
Modifica-se, tanto com o rolar dos tempos como as influências de outros locais.
Ainda bem!<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A quaresma, na aldeia sem luz elétrica e encravada na serra
entre pinheiros e mato, com as mulheres, na sua maioria vestidas de negro,
embiocadas com lenços pretos na cabeça a lembrar “ burkas”, vivia-se cheia de
medos do inferno com penas pesadas da mão divina, ou braseiros a queimarem-nos
a alma.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">E era assim que a quaresma era vivida. Sem um bailarico para
nos animar. Com as músicas transmitidas pela rádio roufenho e sempre de cariz
religioso. Havia a proibição de comer carne e fazer jejum, muito jejum, a que
nós crianças escapávamos, precisamente por sermos crianças,<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">As missas em latim, que ninguém entendia nada. Mas tínhamos
obrigação de assistir.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A igreja sombria, pesada, de pedra, era por si já um
respeito. As imagens, também, esculturas de pedra olhavam-nos como uma ameaça. <o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Os pecados! Os pecados são pecados e há que os confessar. O
padre sentado, imóvel, dentro do confessionário, farto de tanto pecado igual,
dava a penitência maior ou menor conforme ouvia melhor ou pior o que se lhe
dizia. A imaginação fértil da juventude inventava e confessava pequenos
pecadilhos que nem cometíamos. Era o que vinha à cabeça na hora. É que a
confissão era mais que um ataque de nervos. Coisas banais, tais como roubar
laranjas no quintal do vizinho, esconder os sapatos da avó, etc. etc. Grande
pecado, que hoje me atormenta, ainda, foi quando eu e os meus dois vizinhos,
inocentemente, fomos brincar e encontrámos um campo repleto de abóboras.
Lindas! Pequeninas, redondinhas e ainda verdes. Com um prego grande e durante
toda a tarde divertimo-nos a escrever “ coisas” nas ditas abóboras. Toda a tarde!
…. <o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Não nos lembrámos que ao crescer, crescia tudo o que lá
gravámos. Todos os palavrões enormes que sabíamos. Se um sabia, o outro também
sabia.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A minha mãe quando deu conta nem esperou pela confissão no
confessionário. Deu-nos a penitência, logo ali, à chapada.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Voltando á quaresma. <o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A Semana Santa era vivida com um espírito de religiosidade e
sacrifício imposto pela tradição. O que se podia, ou não fazer.<span style="mso-spacerun: yes;"> </span><o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Nunca levei muito a sério todos os rituais impostos. Aqueles
longos sermões encomendados para pagamento de promessas com o padre empoleirado
no alto do púlpito, e o varandim enfeitado com toalha bordada, falando das
penas do purgatório e do inferno. Havia procissões da Via Sacra e cerimónias o
dia todo prolongando-se pela noite escura.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Eu, que gosto de luz, sol e ver o inicio do dia tinha que
ficar ali com o escuro natural da igreja. Já por isto mesmo era um sacrifício. <o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Na sexta-feira santa, que era conhecida por trevas – sexta-feira
de trevas – as cerimónias eram bem diferentes. Por ser trevas, costumava-se
levar uma pedra grande e bater com ela no chão de madeira a fim de fazer
barulho. Muito barulho! Era a despedida da quaresma e espantar os demónios e
entrar no sábado de aleluia. Costume antigo que se perdeu nos tempos.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">A igreja não tinha bancos. Eram as pessoas que tinham uns
banquinhos que levavam de casa. As mulheres usavam saias longas, rodadas. Ao
sentar-se, nós, com a ponta do pé desviávamos os referidos bancos. Lá iam as
mulheres ao chão. Tínhamos o cuidado de sair do local e ficar com cara de
santo. Pois santos! No mesmo ritual das trevas e as pedras a bater no chão, as
saias das mulheres ajoelhadas ali tão perto. Levávamos um ou dois pregos que
pregávamos no fundo das saias. Estas ficavam presas ao chão. Mais risota. <o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">O pior foi, quando pediram a um frade para fazer o sermão,
encomendado por gente grada da aldeia. O frade foi cedo demais e para ocupar o
tempo que faltava, lembrou-se fazer as suas orações e meditações pela coxia da
igreja, que é de laje e xisto. Ia andando pela igreja acima até ao altar e dando
a volta chegava à porta principal, num trajeto feito de oração.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Alguém trouxe de casa uma bola de algodão embebida com o
líquido da garrafinha de mau cheiro, que sobrou do carnaval e a atirou para
dentro do capuz do frade.<o:p></o:p></span></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="margin: 0cm 0cm 10pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 12pt; line-height: 115%;"><span style="font-family: "calibri";">Este notava o cheiro pestilento e os paroquianos que iam
chegando, também. Iam - se entreolhando desconfiados pensando quem seria.
Depois de algum tempo alguém se lembrou de procurar dentro do capuz do frade.
Lá estava ela sossegadinha, mas com tal cheiro que nem no inferno das
ilustrações que nos mostravam na catequese.</span></span><br />
<span style="font-family: "calibri";"> Natércia Martins</span></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-77011291182002087522012-12-04T16:58:00.001+00:002019-11-24T17:58:08.213+00:00Ti Manel da cruz<div align="CENTER" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Ti
Manel da Cruz</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">A
casa do Ti Manel da Cruz era um amontoado de coisas. Uma só
assoalhada com a cama e lareira juntas.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Casa
de banho? Não havia. As necessidades fisiológicas eram
feitas num pátio com mato a servir de tapete, onde em tempos
houve galinhas e ovelhas.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="background-color: white;"><span style="color: white;"><span style="font-size: small;">A
idade e a paciência não lhe permitia ter animais Por
outras palavras: Não estava para aí virado. Davam
trabalho. </span></span>
</span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Homem
já velho, solteiro, olhar vago, como que a pensar no que não
lhe apetecia fazer.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="background-color: white;"><span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Sempre
morou sozinho. Nunca quis casar porque sempre teve a ideia que as
mulheres além de exigentes, teimosas, vaidosas e refilonas dão
muito trabalho. Além disto, que já não é
pouco, uma mulher deve gastar muito dinheiro. Ah! Isso é que
não. O seu dinheiro? Elas precisam de coisas que são
absolutamente inúteis, tal como vestidos, blusas, sapatos e
ainda pior: precisam de espaço para arrumar o que ele gostava
de ter desarrumado. </span></span>
</span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="background-color: white;"><span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Em
novo ainda pensou em namorar com a vizinha do fundo da rua. Bonita e
com um corpinho de fazer inveja aos rapazes. Nos bailaricos de
carnaval ou de verão, lá estava ela a dançar,
fazendo rodopiar a saia de godés, mostrando umas pernas bem
torneadas. Pensou bem e desistiu. </span></span>
</span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Os
anos foram passando e sem os contar chegou à velhice.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Sentou-se
na cama, onde não havia lençóis. Apenas uns
cobertores da Serra da Estrela, herdados da mãe quando morreu.
Herdou também uma panela e uns pratos, alguns com falhas nas
bordas. Lavava-os quando lhe apetecia. A televisão pequenita
sem grande definição dava para ver um ou outro filme.
Gostava de ver cinema americano. A língua não o
atrapalhava. Não entendia o que diziam. As legendas davam para
ler. Achava graça àquela forma de falar. Então
quando havia cavalos e cow- boys o filme ainda era melhor.
Estendia-se na cama e enquanto lia as legendas, ria rebolando-se para
um lado e para o outro.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Uma
tarde de Inverno apeteceu-lhe ir até ao café, no centro
da vila. Olhou para os cartazes que anunciavam grandes prémios
conseguidos através de uma coluna do totoloto. E se
experimentasse? Nunca se sabe …. Pegou no papelinho, escolheu os
números, registou, meteu o papelinho no bolso e saiu. Já
em casa, pendurou o casaco nas costas da cadeira e nunca mais ligou
àquele papelinho cheio de números.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Os
dias foram passando.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Um
dia adoeceu. Foi ao médico que diagnosticou uma pneumonia.
Ficou internado.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Nunca
disse que tinha registado aquele boletim. E o tempo foi passando.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="background-color: white;"><span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Alguém
na vila ganhou um prémio de milhões. Quem seria? O
cartaz a anunciar os números esteve afixado na porta do café.
A incógnita do ou da vencedora mantinha-se. Afinal quem seria?
Todas as pessoas iam e vinham com os boletins a confirmar. Ninguém
apareceu com o boletim premiado. </span></span>
</span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">O
Ti Manel da Cruz continuava internado, até que o sino da
igreja deu a má notícia. Não tinha resistido.
Morreu calmamente na cama limpa e branca do hospital. Pediram roupa a
fim de o vestir para a sua última morada.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="background-color: white;"><span style="color: white;"><span style="font-size: small;">A
irmã procurou na casa o que pôde e o que se poderia
aproveitar. Finalmente pegou no casaco. Agarrou-o da cadeira onde ele
o pendurou no dia em que fora à vila. Revistou os bolsos. E
bem dobradinho um boletim do Totoloto. Primeiro nem ligou. Pegou de
novo no boletim e viu com espanto que os números coincidiam
com os do cartaz do café. Foi ele que acertou na chave certa.
</span></span>
</span></div>
<div align="RIGHT" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="background-color: white; font-size: small;">Natércia
Martins</span></span></div>
<div align="RIGHT" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;"><span style="background-color: white;">2</span><span style="color: white;">012</span></span></span></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-67407920735030544982012-09-27T17:16:00.001+01:002012-09-27T17:17:20.958+01:00<div align="CENTER" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A
candeia da minha bisavó</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A minha avó
tem, pendurada, por cima da lareira, uma candeia. É muito
velha e não está em muito bom estado.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Diz que era da
avó do meu pai, portanto, minha bisavó. Tem um depósito
que se enchia de azeite e por cima uma torcida feita de trapo velho.
Era a iluminação daquele tempo.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Numas férias
em que fui passar uns dias na aldeia, fiquei sozinha enquanto a minha
avó e o meu avô foram tratar dos animais ao quintal. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Sentei-me no
cadeirão, onde se senta o meu avô, frente à
lareira acesa e olhei mais uma vez para a candeia. Arregalei os
olhos. É que a sair do bico da candeia, muito devagarinho
vinha uma menina vestida de cor-de-rosa e trazia uma varinha na mão.
Fiquei muito admirada. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Oh! Vinha
falar comigo.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>__ Sara! Olha
à tua volta. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Sentados nos
degraus da escada estavam os anõezinhos, a Branca de neve, o
Pirata com uma perna de pau e Ali Bábá, o capuchinho
vermelho e o príncipe da história da Cinderela. A
Cinderela também lá estava.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>O sebastião
dormia enroscado mesmo ao lado, levantou uma orelha, depois outra,
mexeu a cauda e acordou. Quando viu tanta gente ia para se levantar
assustado, mas eu disse-lhe que estivesse quieto que todas aquelas
personagens eram das histórias que eu lia em pequena.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Um tapete
mágico aterrou mesmo aos meus pés. Sentei-me em cima e
voei pela janela aberta. Passei por cima das ruínas romanas de
Conímbriga. Ali havia romanos e escravos a morar.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Na casa dos
repuxos uma menina como eu chamou-me: </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>__ Sara! Vem
brincar com estas pedrinhas que apanhei ali no lago.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Assim
estivemos durante muito tempo. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A menina
ria-se muito e eu também. Corremos por entre os muros do
palácio. Já perto da noite veio uma criada buscá-la.
E agora? O tapete voador tinha fugido e eu fiquei sozinha a chorar
muito. A tal senhora vestida de cor-de-rosa veio ao meu encontro.
Vinha a cavalo no gato da minha avó. O sebastião pousou
e lá fomos as duas outra vez para casa.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Quando entrei
era uma festa. Os anões brincavam à macaca, o pirata
fazia piruetas só com uma perna, a Branca de neve ria-se muito
com estas brincadeiras.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Enquanto isto
se passava, bateram à porta. Era o lobo mau que fugiu da
história da menina que ia levar o lanche à avozinha, na
mata, e os caçadores vinham atrás dele. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A rapariga do
Capuchinho vermelho também estava senta junto à lareira
com o cestinho cheio de bolos, no colo.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A minha avó
e o meu avô chegaram do quintal e correram com o lobo mau. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Esta história
ficou uma trapalhada mas é uma pequena prenda dos teus 10
anos.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Quando vieres
a casa da avó lembra-te da candeia da tua bisavó que
continua pendurada num prego por cima da lareira. Pode ser que a
menina vestida de cor de rosa te venha visitar de novo.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Natércia
Martins</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>2012 </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-84845768562916903982012-09-26T16:06:00.001+01:002012-09-26T16:06:11.536+01:00
<div align="CENTER" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: large;"><i><b>A
última viagem</b></i></span></span></div>
<div align="CENTER" style="margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Conhecia –
os vagamente da minha antiga rua. Um dia, entrei naquela casa, não
sei muito bem, qual a força que me impeliu. Foi por instinto
ou talvez uma mão invisível e misteriosa me levasse lá.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Dei por mim a
cuidar de uma família que mal conhecia.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>As primeiras
vezes foi-me muito estranho.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A mãe,
senhora de estatura pequena, magra e frágil, suportava,nos
ombros, com força incrível, a vida de filhos tão
diferentes.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Pouco a pouco
fui fazendo parte da família. Qualquer coisa que não
sei explicar me vai empurrando, cada vez mais ali para dentro da
porta.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>É como
se uma voz de alguém, que não sei quem é, me
segredasse ao ouvido:</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- Entra. És
lá precisa !</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Nada se faz
por acaso. Eu fui entrando.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Há uns
anos jurei que nunca mais abria o coração a ninguém.
Tranquei-o com um cadeado, imune a qualquer tentativa de me deixar
levar pela emoção. Engano meu !</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Aquela mão
muito branca com dedos afiados, enlaçando os meus, comeveu-me.
Depois uns olhos meigos, de cachorro escorraçado, fizeram o
resto. Uma voz fininha, meiga, sumida, pediu água. O copo
bateu nos dentes produzindo um tilintar que me percorreu o corpo todo
como se fosse um raio que me atravessou os ossos um a um.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Era um homem
que parecia muito mais velho do que na realidade era. Doente. Muito
doente. Enterrado na cama de lençóis muito brancos e
uma colcha bordada com rosas grandes. Antiga aquela colcha !</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Herdada das
mãos habilidosas da mãe, pessoa que até à
minha chegada cuidava dele.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>E foi assim
que, sem dar conta, dei por mim a entrar devagarinho naquela casa
antiga, de móveis velhos que fariam as delicias de um qualquer
antiquário.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>E eu, sem
querer, ali estava, sentada numa cadeira forrada de palhinha
entrançada, junto a um doente que mal conhecia. Pensei que
fosse um anjo, aliás, parecia um anjo.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A cabeça
e a face muito branca confundiam-se com o branco do lençol. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Delirava.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Perguntou pela
fotografia.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- Que
fotografia ?</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- A que eu
guardo no bolso do casaco.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Procurei no
bolso do pijama. Não havia nada. Apenas e só um pouco
de cotão.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Não me
lembro de alguma vez lhe ter visto um casaco vestido.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>A mãe,
que entretanto entrou no quarto disse-me:</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- Não
lhe ligues. Delira. Pergunta muitas vezes pela fotografia. Mas eu
nunca vi nada.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Fechou os
olhos, parecendo dormitar. Entrou, de novo, no torpor habitual.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Aproveitei
para me levantar e dar uma vista de olhos pelo quarto. Lá ao
fundo, uma velha mala. Tão velha que ao tentar levantá-la
se desmanchou. Um livro, do meio de outros livros, caiu. Lá de
dento saltou uma fotografia, velha, amarrotada e amarelada pelo
tempo. Curvei-me e apanhei-a. Ah ! Aquela era a fotografia que ele
procurava. Era eu ! Rapariga de vinte e tal anos, com vestido curto e
farto “ rabo de cavalo”.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>O que estava
ali a fazer ? Como é que a fotografia foi ali parar ? Tudo tão
estranho, como estranho foi o novo contacto com aquela família.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Sentei-me de
novo. Ele dormia agora, com um ligeiro sorriso nos lábios.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Afinal morámos
na mesma rua, em tempos.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Com o rolar do
tempo e a vida que entretanto se modificou, nunca mais nos vimos,
pensava eu. Afinal parece que não terá sio bem assim. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Chegou a noite
e a hora de jantar. A fotografia ficou em cima da mesa de cabeceira.
Iria esperar por momentos de lucidez para lhe fazer a pergunta que
entretanto me “atazanava” a cabeça. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Porque estava
a minha fotografia dentro do livro ? Quem a tirou ? </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Quando abriu
os olhos e meio zangada, perguntei:</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- O que é
isto ? Que fotografia é esta ?</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- É
tua. Não te conheces ?</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- Isso eu
sei. Que é minha eu vi !</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Uma lágrima
grande rolou – lhe pela face macilenta.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>-- Nem
imaginas. Quem tirou essa fotografia fui eu. Deixei de ir ao cinema.
Deixei de comprar pequenas coisas para conseguir o dinheiro para
comprar uma máquina. Segui-te dias a fio. Sem te aperceberes
tirei a foto. Foi a minha companhia em noites quentes de África.
Ao por do sol, olhava o céu e via-te desenhada nas nuvens
coloridas.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Eras a minha
companhia. Em horas mais tristes e saudosas de tudo, cheias de
angustia, lá estavas tu, sorridente no quadradinho de papel.
Escrevi-te cartas que nunca enviei. Fiz poemas que nunca leste. E
agora és tu que vieste tratar-me. Vou fazer a última
viagem da minha vida. Levo-te comigo, mais uma vez. </b></span>
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b>Fechou os
olhos e partiu ......</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><b> Natércia
Martins</b></span></div>
Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-17124842718086219522012-08-11T19:42:00.001+01:002012-08-11T19:42:46.095+01:00<div align="CENTER" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">O
velho solar</span></span></div>
<div style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Um
solar é uma casa enorme com grandes janelas e grandes salões.
Imagino que assim seja. Nunca lá entrei, mas costumo passar na
estrada onde há um. Tem o brasão de pedra, no alto, por
cima da porta da entrada. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Hoje
está semiabandonado embora os donos o visitem de vez em
quando. Visita rápida porque as vidas profissionais são
na cidade grande.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Imagino-me
lá dentro a dançar ao ritmo de uma orquestra. O salão
grande iluminado por enormes candeeiros com o mestre de cerimónias
a dar as suas ordens. As senhoras vestidas com saias compridas e
blusas de renda Os homens a transpirar dentro das casacas com abas de
grilo e camisas de colarinho engomado. Noite dentro serve-se um chá
e bolinhos feitos na cozinha pelas criadas de farda branca e crista
de renda na cabeça. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Os
quartos de dormir com camas forradas de veludo e dossel de tule
branco. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Lá
dentro a azáfama de criados e criadas a atravessar os
corredores com baixelas de prata na mão a fim de servir os
convidados. Ouvem-se as gargalhadas das pessoas abafadas pelo som da
orquestra que toca valsas, tangos e ritmos variados pela mistura de
novas músicas. Seria assim a vida lá dentro ? Outros
tempos !</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Aquele
solar meio abandonado agora não tem vida. O brasão por
cima da porta coberto com um pano preto, indica luto pela morte do
proprietário. Afinal as pessoas foram embora, os criados já
lá não vivem e da orquestra resta um piano de cauda,
velho a um canto do salão.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Uma
pena! Nos quartos de dormir ainda ficaram as camas mas o dossel foi
substituído por teias de aranha. Os ratos tomaram conta da
casa. As tábuas do chão outrora encerado apresentam-se
baças e sem brilho. As pratas e os linhos que compunham os
armários e arcas também já lá não
estão. Mas o pano que cobre o brasão deu ao solar um
cunho de assombrado. Dizem os vizinhos que de noite se ouvem passos a
vaguear pelas salas vazias. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Na
aldeia a imaginação é fértil em casos de
assombração. Este não foge à regra. Tem
almas penadas, correntes a fazer barulho e gargalhadas como que a
gozar com quem se atrever a incomodá-los.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">O
meu vizinho é pedreiro e uma imaginação fértil
nestes casos de almas penadas.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Um
dia os donos do solar pediram-lhe que fosse ao telhado porque uma
telha fora do sítio deixava cair umas “ beiras” que
degradavam ainda mais o chão já por si muito velho.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">O
homem lá foi. Saiu do trabalho na obra de todos os dias e ao
anoitecer subiu ao telhado. Colocou a telha no lugar, fez mais uns
pequenos arranjos numas outras telhas e saiu pelo jardim passando
pelo portão onde já as roseiras deitavam os ramos por
cima do caminho. Fez-se noite entretanto. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Ao
atravessar o jardim ouviu o piano tocar notas desafinadas. Quem seria
o músico ? </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Claro!
Almas do outro mundo ! Correu para a saída enquanto uma mão
invisível lhe arrancou a boina que trazia na cabeça.
Pegou na bicicleta e correu para casa. O piano dentro de casa a tocar
sozinho e ainda lhe arrancaram a boina…..</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">No
outro dia o pai, moleiro de profissão, passou pela aldeia a
fim de deixar uns sacos de farinha e quando avistou o filho perguntou
o que fazia a boina pendurada na roseira do solar.</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">O
meu vizinho espantado olhou para a boina na mão do pai e
pensou que afinal quem lha tinha tirado não foi mais que a
roseira. Não levantou a cabeça o suficiente para lhe
passar por baixo. Então e o piano ? Como tocava sozinho ?
Hummmm! Tinha que indagar. Esperou pela noite, porque as almas só
andam de noite, e foi até ao solar. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Entrou
pela cozinha e dirigiu-se ao salão. Precisava tirar as “
coisas a limpo”. Nem era medroso e quem quer que fosse tinha que se
mostrar. Sentou-se muito quietinho num banco e esperou. O piano
começou a tocar mais desafinado. Abeirou-se e ninguém. </span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Com
cuidado levantou a tampa do teclado. Ninguém, mas uma ratazana
saiu de lá a correr fazendo uma escala quase perfeita no velho
piano de cauda que outrora servira para abrilhantar os bailes. O meu
vizinho verificou que afinal os “ fantasmas” existem e de que
maneira !</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">Natércia
Martins</span></span></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<span style="color: white;"><span style="font-size: small;">2012
</span></span>
</div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="JUSTIFY" style="margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>Natércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7443923117546080661.post-32320399445879957932012-08-11T16:03:00.001+01:002012-08-11T16:03:39.863+01:00O velho solarNatércia Martinshttp://www.blogger.com/profile/10383154679828281836noreply@blogger.com0